Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/patriciacamposmello/2017/05/1883168-direita-volta-a-protestar-contra-a-imigracao.shtml
Por Patricia Campos Mello
12/05/2017 02h00
O movimento Direita São Paulo promove na terça-feira (16) mais uma manifestação contra a nova Lei de Migração. O objetivo é pressionar o presidente Michel Temer para que ele não sancione a lei, de autoria do hoje chanceler Aloysio Nunes.
"Diante das ameaças à Soberania Nacional com o Congresso Nacional legislando contra o povo brasileiro, criando leis que abrem as portas da Nação ao terrorismo, a Direita São Paulo vai às ruas novamente em defesa da nossa Soberania", é a convocação no Facebook para o evento.
Direita São Paulo/Facebook
Foto da página do Direita São Paulo em uma rede social mostra o protesto de 2 de maio
Foto da página do Direita São Paulo em uma rede social mostra o protesto de 2 de maio
"Tendo em vista que a nova Lei de Migração tira alguns dos poderes de controle de entrada de estrangeiros no Brasil da Polícia Federal e o entrega às ONGs internacionais e globalistas, tendo em vista que esta lei pode trazer ao Brasil grupos terroristas a exemplo das Farc [Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia] e do Estado Islâmico."
E continuam "Você já viu o que está acontecendo hoje na Europa? Londres, Paris, Munique... Mulheres são estupradas pelos ditos "refugiados", as ruas estão uma Meca a céu aberto, quantos atentados terroristas sofreu a França? Quantas vidas perdidas? Confusão, confrontos, caos... Não queremos isso para o BRASIL!
DIGA NÃO À LEI DE (i)MIGRAÇÃO"
Na última manifestação anti-imigração, em 2 de maio, houve confusão. A Polìcia Militar deteve dois palestinos acusados de jogar um "artefato explosivo" nos manifestantes. Os advogados de defesa dos dois negam.
Em seu site, os organizadores do protesto publicaram um vídeo de um homem soltando uma bomba, ao lado do título "URGENTE: TERRORISTAS ÁRABES ATACARAM A DIREITA SÃO PAULO DURANTE NOSSO ATO CONTRA A LEI DA IMIGRAÇÃO!"
Conversei com o empresário Edson Salomão, 39, presidente do movimento Direita São Paulo. Segundo ele, a nova lei "tira poderes da PF de fiscalizar a entrada de estrangeiros e abre as portas para pessoas de má índole."
Do ponto de vista da PF, de fato há perda de poder, porque a lei proíbe a pronta deportação de migrantes detidos nas fronteiras pelos policiais. Eles passam a ter direito a um defensor público.
Pergunto a ele por que está tão preocupado com o "terrorismo islâmico" no Brasil, uma vez que nunca houve "terrorismo islâmico" no Brasil.
"Ah, mas não quer dizer que não vá ter um dia. Na Europa era assim, no início entrou um monte de gente e aí acabaram tendo todos aqueles ataques terroristas."
Salomão diz que não se opõe à imigração ou aos refugiados, apenas à entrada indiscriminada de imigrantes possibilitadas pela nova lei. "Somos todos descendentes de imigrantes, mas antes era diferente." (Como bem ironizou meu colega de mesa, Daniel Avelar: imigrante é quando a pessoa é mais pobre e mais escura que você; se for mais rico e mais branco, é estrangeiro).
O líder do Direita São Paulo cita os "400 índios em Manaus, que levaram a cidade a uma situação de calamidade pública." "Quando entra um grande contingente de pessoas, isso prejudica a estrutura social, o emprego e a moradia."
Grande contingente? Segundo dados de fevereiro do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), existem 8.950 refugiados no Brasil —2480 são sírios, 1501 angolanos e 1.150 da República Democrática do Congo.
No Brasil, há apenas 0,04 refugiados por mil habitantes (dados do Acnur de 2015).
No Líbano, há 200 refugiados a cada 1 mil habitantes —está bem ao lado da Síria, onde uma guerra civil já causou êxodo de 4,8 milhões de pessoas para outros países.
Mas nem é preciso ir longe —a Argentina acolhe duas vezes mais refugiados que o Brasil, e a Costa Rica, um país minúsculo, absorve 18 vezes mais refugiados por mil habitantes do que nós.
Além dos refugiados, temos a entrada dos haitianos, que vinham com visto humanitário e são cerca de 70 mil no país, e dos venezuelanos, que também ganharam direito ao visto humanitário e são cerca de 20 mil.
Mesmo assim, para uma população de cerca de 209 milhões em 2017, não é exatamente uma calamidade pública.
O Direita São Paulo apoia a candidatura do deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) à presidência e não se limita à bandeira anti-imigração.
"Não estamos falando da falsa Direita como MBL ou PSDB, mas da Direita Conservadora e Reacionária que luta pela causa da família, dos valores, das forças armadas, pela fé e pelo patriotismo", diz o grupo no Facebook.
No Facebook, deixam claro quem são os inimigos. Ao lado de uma foto do financista George Soros, lê-se: "este homem é o responsável pelo financiamento da morte de milhões de jovens pelas drogas e pela forte campanha contra a vida de policiais militares."
Une-se muito o nome de Soros ao adjetivo "globalista", também usado de forma pejorativa pela direita populista nos Estados Unidos e na França. É o uso do que os americanos chama de "dog whistle" —é uma forma velada de apelar ao eleitor antissemita.
Tudo isso poderia ser folclórico e esses grupos, uma franja radical do eleitorado.
Mas o Datafolha mostrou que Bolsonaro lidera entre os eleitores com ensino superior, com 21% de intenções de voto, e também entre aqueles com renda mensal superior a 10 salários mínimos, com 28%.
Nos Estados Unidos, Donald Trump era tratado como piada, e acabou presidente do país.
Blog focado em Geografia e em fatos e notícias contemporâneas, que compõem as Atualidades.
terça-feira, 30 de maio de 2017
Doria esvazia a Virada e desperdiça recursos públicos
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/nabil-bonduki/2017/05/1886475-doria-esvazia-a-virada-e-desperdica-recursos-publicos.shtml
Por Nabil Bonduki
23/05/2017 02h00
Esta coluna poderia ter diferentes títulos: Virada esvaziada; do Fora Temer; do desfile (e violência) policial na cracolândia; do Bradesco. Mas como Doria interferiu diretamente na Virada, vamos analisá-la sob a ótica da gestão. E, nesse sentido, ela foi um desastre organizativo e econômico. Indiscutivelmente, teve a pior relação custo/benefício das suas 13 edições.
Proposta por Serra em 2005, a Virada articulou cultura e espaço público, tornando-se o maior festival de cultura do mundo. Atravessou três gestões como uma festa da cidade, sem coloração partidária, mas o prefeito resolveu desconstruir sua concepção.
Desconhecendo a dinâmica urbana e cultural de São Paulo, quis confinar o evento ao autódromo de Interlagos, revelando uma visão segregadora que se opõe ao conceito de ocupação do espaço público ancorado na criação, na convivência e na cidadania cultural.
Embora aprecie eventos em suas regiões, o paulistano também quer vir ao centro, que é de todos, rejeitando o confinamento no "gueto". A Virada sempre foi o momento de encontro dos jovens de diferentes regiões, classes e gostos culturais.
Para conciliar o desejo do prefeito com o vigor da Virada, a Secretaria de Cultura gerou seu esvaziamento. Retiraram os grandes shows do centro e propuseram uma descentralização que, embora anunciada como novidade, já vinha ocorrendo há vários anos.
Em 2016, além do centro, a Virada ocorreu em 81 diferentes pontos da cidade, em todas as subprefeituras, incluindo palcos externos, Ruas Abertas e equipamentos municipais, com atividades complementares às do centro, para um público específico. Essa descentralização, entretanto, não alterou o seu espírito. Um grande público, atraído por artistas renomados, circulava por 24 horas no centro, usufruindo da diversidade e conhecendo novos artistas, linguagens e gêneros.
Em 2017, a potência do centro não se transferiu para os caros palcos descentralizados, situados em locais de difícil acesso. Shows foram cancelados ou tiveram um público incompatível com a importância do artista; o participante da Virada não quer ir a um espetáculo, quer circular entre várias atrações.
Além da censura velada aos artistas, a desarticulação institucional gerou situações constrangedoras. Em Interlagos, a programação infantil ocorreu simultaneamente a uma corrida automobilística, para espanto dos poucos que foram assistir.
Nada, entretanto, foi pior que a falta de preocupação em programar uma operação policial de grande envergadura e violência no mesmo horário e a poucos metros de onde estava previsto o, até então, maior evento cultural do país...
O dia da Virada, que deveria ser de alegria e convivência, tornou-se ainda mais pesado que o momento que vive o Brasil.
Por Nabil Bonduki
23/05/2017 02h00
Esta coluna poderia ter diferentes títulos: Virada esvaziada; do Fora Temer; do desfile (e violência) policial na cracolândia; do Bradesco. Mas como Doria interferiu diretamente na Virada, vamos analisá-la sob a ótica da gestão. E, nesse sentido, ela foi um desastre organizativo e econômico. Indiscutivelmente, teve a pior relação custo/benefício das suas 13 edições.
Proposta por Serra em 2005, a Virada articulou cultura e espaço público, tornando-se o maior festival de cultura do mundo. Atravessou três gestões como uma festa da cidade, sem coloração partidária, mas o prefeito resolveu desconstruir sua concepção.
Desconhecendo a dinâmica urbana e cultural de São Paulo, quis confinar o evento ao autódromo de Interlagos, revelando uma visão segregadora que se opõe ao conceito de ocupação do espaço público ancorado na criação, na convivência e na cidadania cultural.
Embora aprecie eventos em suas regiões, o paulistano também quer vir ao centro, que é de todos, rejeitando o confinamento no "gueto". A Virada sempre foi o momento de encontro dos jovens de diferentes regiões, classes e gostos culturais.
Para conciliar o desejo do prefeito com o vigor da Virada, a Secretaria de Cultura gerou seu esvaziamento. Retiraram os grandes shows do centro e propuseram uma descentralização que, embora anunciada como novidade, já vinha ocorrendo há vários anos.
Em 2016, além do centro, a Virada ocorreu em 81 diferentes pontos da cidade, em todas as subprefeituras, incluindo palcos externos, Ruas Abertas e equipamentos municipais, com atividades complementares às do centro, para um público específico. Essa descentralização, entretanto, não alterou o seu espírito. Um grande público, atraído por artistas renomados, circulava por 24 horas no centro, usufruindo da diversidade e conhecendo novos artistas, linguagens e gêneros.
Em 2017, a potência do centro não se transferiu para os caros palcos descentralizados, situados em locais de difícil acesso. Shows foram cancelados ou tiveram um público incompatível com a importância do artista; o participante da Virada não quer ir a um espetáculo, quer circular entre várias atrações.
Além da censura velada aos artistas, a desarticulação institucional gerou situações constrangedoras. Em Interlagos, a programação infantil ocorreu simultaneamente a uma corrida automobilística, para espanto dos poucos que foram assistir.
Nada, entretanto, foi pior que a falta de preocupação em programar uma operação policial de grande envergadura e violência no mesmo horário e a poucos metros de onde estava previsto o, até então, maior evento cultural do país...
O dia da Virada, que deveria ser de alegria e convivência, tornou-se ainda mais pesado que o momento que vive o Brasil.
Na cracolândia, Doria deixou cair a máscara de bom gestor
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/nabil-bonduki/2017/05/1888517-na-cracolandia-doria-deixou-cair-a-mascara-de-bom-gestor.shtml
Por Nabil Bonduki
30/05/2017 02h00
Para quem ainda tinha dúvidas, Doria mostrou, na última semana, que é pouco preparado para administrar uma cidade da complexidade de São Paulo; se busca cargos mais elevados, precisa comer muito feijão com arroz na planície.
A gestão pública requer atributos que vão muito além do gerenciamento de um negócio. Área de conhecimento com teoria e conceitos próprios, requer formação e experiência, além de habilidade política, sensibilidade humana e capacidade de ouvir opiniões contraditórias antes de tomar decisões.
A Prefeitura de São Paulo não é para amadores. Estrutura complexa, com centenas de milhares de funcionários e terceirizados, lida com inúmeras políticas setoriais, regidas por leis próprias, requerendo coordenação e articulação. Não é uma empresa de marketing, um canal de comunicação ou um negócio de lobby.
O prefeito ignora essa realidade. Preocupa-se mais com o Facebook do que em formular políticas públicas em conjunto com sua equipe. Quer aparecer como um gestor eficiente e autoritário, que acorda cedo e dorme tarde, como se isso bastasse para gerir uma megacidade. Espera resultados rápidos, mesmo que efêmeros, para reforçar essa imagem falsa.
Desinformado e sem estratégia, vislumbrou na equivocada ação policial na cracolândia mais uma oportunidade para se promover como um eficiente defensor da ordem e da limpeza urbana e social. De blusão preto, que lembra as milícias fascistas, se misturou aos policiais e declarou que a cracolândia tinha acabado, para espanto de seus próprios secretários.
Sem coordenação institucional, planejamento e apoio de especialistas, achava que resolveria no grito um crônico drama social. Improvisadamente, derrubou casarões ocupados, ferindo moradores, e anunciou um arquiteto de grife para maquiar a área, como se essa fosse a questão. A cracolândia mudou de lugar e se espalhou.
Ignorando as leis do país e os direitos humanos universais, o prefeito pretendeu, com bravatas, tirar a questão social do mapa da cidade, eliminando os seres humanos que considera indesejáveis e suprimindo os territórios que ocupavam. Por fim, pediu autorização judicial para recolher, coletiva e compulsoriamente, supostos usuários de drogas, contrariando a Lei Antimanicomial, sancionada por FHC em 2001. A mobilização da sociedade, da Defensoria Pública e do Ministério Público freou os instintos autoritários do prefeito.
O prefeito "novo" reproduz o vício dos políticos tradicionais: interrompe programas das gestões anteriores, sem propor nada no lugar. De "novo", apenas a habilidade no Facebook. Que ele tenha a humildade de dar dois passos atrás: ouvir os especialistas, avaliar os pontos positivos e negativos do Braços Abertos e debater com a sociedade a melhor forma de enfrentar o problema.
Por Nabil Bonduki
30/05/2017 02h00
Para quem ainda tinha dúvidas, Doria mostrou, na última semana, que é pouco preparado para administrar uma cidade da complexidade de São Paulo; se busca cargos mais elevados, precisa comer muito feijão com arroz na planície.
A gestão pública requer atributos que vão muito além do gerenciamento de um negócio. Área de conhecimento com teoria e conceitos próprios, requer formação e experiência, além de habilidade política, sensibilidade humana e capacidade de ouvir opiniões contraditórias antes de tomar decisões.
A Prefeitura de São Paulo não é para amadores. Estrutura complexa, com centenas de milhares de funcionários e terceirizados, lida com inúmeras políticas setoriais, regidas por leis próprias, requerendo coordenação e articulação. Não é uma empresa de marketing, um canal de comunicação ou um negócio de lobby.
O prefeito ignora essa realidade. Preocupa-se mais com o Facebook do que em formular políticas públicas em conjunto com sua equipe. Quer aparecer como um gestor eficiente e autoritário, que acorda cedo e dorme tarde, como se isso bastasse para gerir uma megacidade. Espera resultados rápidos, mesmo que efêmeros, para reforçar essa imagem falsa.
Desinformado e sem estratégia, vislumbrou na equivocada ação policial na cracolândia mais uma oportunidade para se promover como um eficiente defensor da ordem e da limpeza urbana e social. De blusão preto, que lembra as milícias fascistas, se misturou aos policiais e declarou que a cracolândia tinha acabado, para espanto de seus próprios secretários.
Sem coordenação institucional, planejamento e apoio de especialistas, achava que resolveria no grito um crônico drama social. Improvisadamente, derrubou casarões ocupados, ferindo moradores, e anunciou um arquiteto de grife para maquiar a área, como se essa fosse a questão. A cracolândia mudou de lugar e se espalhou.
Ignorando as leis do país e os direitos humanos universais, o prefeito pretendeu, com bravatas, tirar a questão social do mapa da cidade, eliminando os seres humanos que considera indesejáveis e suprimindo os territórios que ocupavam. Por fim, pediu autorização judicial para recolher, coletiva e compulsoriamente, supostos usuários de drogas, contrariando a Lei Antimanicomial, sancionada por FHC em 2001. A mobilização da sociedade, da Defensoria Pública e do Ministério Público freou os instintos autoritários do prefeito.
O prefeito "novo" reproduz o vício dos políticos tradicionais: interrompe programas das gestões anteriores, sem propor nada no lugar. De "novo", apenas a habilidade no Facebook. Que ele tenha a humildade de dar dois passos atrás: ouvir os especialistas, avaliar os pontos positivos e negativos do Braços Abertos e debater com a sociedade a melhor forma de enfrentar o problema.
Um ponto sem retorno
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2017/05/1887987-um-ponto-sem-retorno.shtml
THOMAS LOVEJOY
28/05/2017 02h00
Foi algo saído diretamente do Livro de Jó. No meio da Grande Depressão da década de 1930, algum agricultor desconhecido do Meio-Oeste americano, sem consciência do que fazia, derrubou algumas árvores que mergulharam o centro do continente norte-americano numa praga ambiental: o "Dust Bowl".
Gigantescas tempestades de areia varreram as grandes planícies e paralisaram durante anos a agricultura praticada nelas. A agricultura americana só conseguiu voltar ao que é hoje graças ao plantio maciço de árvores, fruto de um grande programa governamental chamado Civilian Conservation Corps, e à adoção de métodos melhores de cultivo.
Hoje a Amazônia e o Brasil estão à beira de uma quebra semelhante de sistema. A diferença é que o risco é cientificamente compreendido e amplamente reconhecido.
Essa compreensão se baseia nos elegantes estudos científicos brasileiros de Eneas Salati na década de 1970, mostrando que a Amazônia produz metade de sua própria precipitação pluviométrica, através da chuva que evapora das superfícies complexas da floresta.
A umidade na massa de ar móvel cai na forma de chuva e repete o processo enquanto se desloca em sentido oeste. Isso ocorre a todo instante. Essa foi, na verdade, uma das descobertas científicas mais importantes do século 20: em vez de a vegetação ser simplesmente consequência do clima, a ciência demonstrou que a vegetação afeta o clima.
Desde o início o estudo impôs a pergunta de quanto desmatamento levaria esse ciclo hidrológico a erodir, trazendo à tona um ponto de inflexão que levaria à morte da floresta amazônica. Hoje sabemos que, além do desmatamento, o uso amplo de queimadas e as mudanças climáticas estão todos empurrando o sistema amazônico em direção a um ponto sem retorno.
É difícil fazer uma estimativa precisa de onde se situa esse ponto, mas aqueles de nós que acompanhamos esses estudos pensamos que é provavelmente quando 20% da floresta tiver sido derrubada.
Um fato preocupante é que as secas históricas de 2005 e 2010 foram provavelmente os primeiros sinais indicativos de que o ponto de inflexão está próximo. A Amazônia não é um sistema fechado.
A diferença entre o "Dust Bowl" e hoje é que entendemos o funcionamento do sistema amazônico e não ignoramos a realidade de que simplesmente um incremento de desflorestamento poderá empurrar esse sistema além do ponto de inflexão.
No momento, interesses econômicos no Pará estão promovendo leis que vão degradar as áreas nacionais protegidas já existentes. Na semana passada, o Senado ratificou duas medidas provisórias que reduzem áreas de conservação na Amazônia.
Uma das grandes vantagens do progresso humano é que ele aprofunda a compreensão da importância do meio ambiente, de como ele funciona e como pode ser gerido com prudência para beneficiar o homem. O momento atual exige liderança.
THOMAS LOVEJOY, professor de ciência e política ambiental na Universidade George Mason (EUA), trabalha na Amazônia desde 1965
THOMAS LOVEJOY
28/05/2017 02h00
Foi algo saído diretamente do Livro de Jó. No meio da Grande Depressão da década de 1930, algum agricultor desconhecido do Meio-Oeste americano, sem consciência do que fazia, derrubou algumas árvores que mergulharam o centro do continente norte-americano numa praga ambiental: o "Dust Bowl".
Gigantescas tempestades de areia varreram as grandes planícies e paralisaram durante anos a agricultura praticada nelas. A agricultura americana só conseguiu voltar ao que é hoje graças ao plantio maciço de árvores, fruto de um grande programa governamental chamado Civilian Conservation Corps, e à adoção de métodos melhores de cultivo.
Hoje a Amazônia e o Brasil estão à beira de uma quebra semelhante de sistema. A diferença é que o risco é cientificamente compreendido e amplamente reconhecido.
Essa compreensão se baseia nos elegantes estudos científicos brasileiros de Eneas Salati na década de 1970, mostrando que a Amazônia produz metade de sua própria precipitação pluviométrica, através da chuva que evapora das superfícies complexas da floresta.
A umidade na massa de ar móvel cai na forma de chuva e repete o processo enquanto se desloca em sentido oeste. Isso ocorre a todo instante. Essa foi, na verdade, uma das descobertas científicas mais importantes do século 20: em vez de a vegetação ser simplesmente consequência do clima, a ciência demonstrou que a vegetação afeta o clima.
Desde o início o estudo impôs a pergunta de quanto desmatamento levaria esse ciclo hidrológico a erodir, trazendo à tona um ponto de inflexão que levaria à morte da floresta amazônica. Hoje sabemos que, além do desmatamento, o uso amplo de queimadas e as mudanças climáticas estão todos empurrando o sistema amazônico em direção a um ponto sem retorno.
É difícil fazer uma estimativa precisa de onde se situa esse ponto, mas aqueles de nós que acompanhamos esses estudos pensamos que é provavelmente quando 20% da floresta tiver sido derrubada.
Um fato preocupante é que as secas históricas de 2005 e 2010 foram provavelmente os primeiros sinais indicativos de que o ponto de inflexão está próximo. A Amazônia não é um sistema fechado.
A diferença entre o "Dust Bowl" e hoje é que entendemos o funcionamento do sistema amazônico e não ignoramos a realidade de que simplesmente um incremento de desflorestamento poderá empurrar esse sistema além do ponto de inflexão.
No momento, interesses econômicos no Pará estão promovendo leis que vão degradar as áreas nacionais protegidas já existentes. Na semana passada, o Senado ratificou duas medidas provisórias que reduzem áreas de conservação na Amazônia.
Uma das grandes vantagens do progresso humano é que ele aprofunda a compreensão da importância do meio ambiente, de como ele funciona e como pode ser gerido com prudência para beneficiar o homem. O momento atual exige liderança.
THOMAS LOVEJOY, professor de ciência e política ambiental na Universidade George Mason (EUA), trabalha na Amazônia desde 1965
segunda-feira, 29 de maio de 2017
Caçador de terremotos amador ganha fama no exterior e incomoda cientistas
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/ciencia/2017/05/1887898-cacador-de-terremotos-amador-ganha-fama-no-exterior-e-incomoda-cientistas.shtml
ROGÉRIO PAGNAN
ENVIADO ESPECIAL A CUIABÁ (MT)
EDUARDO GERAQUE
DE SÃO PAULO
28/05/2017 02h00
Desconhecido até mesmo em Cuiabá, onde mora há 22 anos, o operador de áudio Aroldo Maciel Máximo dos Santos, 44, é uma celebridade no Chile, onde chega a precisar de escolta para conseguir circular em locais públicos.
São mais de 400 mil seguidores nas redes sociais, entrevistas concedidas para quase todas as emissoras de TVs do país e até uma carta do ex-presidente chileno Sebastián Piñera com agradecimentos pelos serviços prestados àquela nação.
O motivo de tanto interesse dos chilenos: desde 2012, Maciel conseguiu antecipar –com antecedência de dias– a chegada de dez abalos sísmicos registrados no outro lado dos Andes. Todos eles com magnitude acima de 6 pontos na escala Richter.
O método que tenta entender o padrão dos tremores pelo mundo é polêmico inclusive entre os cientistas da área. É muito difícil cravar a existência de um único padrão.
Até hoje, os pesquisadores de abalos sísmicos são céticos. Para eles, é impossível prever com precisão quando virá um terremoto.
No Chile, marcado por frequentes abalos sísmicos, os serviços de monitoramento registraram, em 200 anos, 97 terremotos de magnitude acima de 7 pontos na escala Richter.
Destes, 18 eventos, acima da magnitude 8, foram classificados como altamente destrutivos pelos estudiosos.
O último evento antecipado pelo brasileiro, de 6,9 pontos, atingiu a região de Valparaíso em 24 de abril. Maciel falava ao telefone com apresentadores de uma TV local sobre o sismo quando ele ocorreu.
A história do operador é ainda mais inusitada porque ele jamais havia estudado geologia –ou área correlata– para conseguir desenvolver a tese que defende.
"Acho que isso até ajudou. Se eu tivesse estudado, talvez não acreditasse que existe algo além de placas tectônicas", diz. "O conhecimento é baseado no que outras pessoas estudaram. Então, se você já tem uma opinião formada, não quer saber de outra verdade."
Ele descobriu um padrão de eventos pesquisando sozinho em um site que monitora tremores em todo o planeta. Imprimiu relatórios de eventos que ocorreram em um intervalo de dez anos, um calhamaço, e passou a analisar os eventos de maior intensidade.
Maciel diz ter chorado quando viu a existência de um padrão. "Imagina você se sentir um nada... Não tinha estudo, não tinha droga nenhuma. Aí você descobre uma coisa e vê que aquilo é grandioso. E numa brincadeira."
Brincadeira porque, segundo ele, a ideia surgiu em um churrasco entre amigos.
Cada um falou uma ideia de como pretendia ficar milionário e Maciel não tinha nenhuma. Uma amiga sugeriu a ideia "impossível" de um serviço de previsão de terremotos.
A tese de Maciel, já apresentada de forma semelhante por outros pesquisadores, é a de que os grandes terremotos seguem um padrão: caminham em linha reta de um ponto a outro, com intervalo de dias dependendo da magnitude do evento.
De um continente ao outro, a velocidade é algo em torno de 155 quilômetros por dia, dependendo da magnitude. Além do Chile, conseguiu, segundo ele, antecipar tremores na Espanha, na Turquia, Equador e no Peru.
O operador continua seu monitoramento e publica nas redes sociais quando há risco de tremores. "Eu só publico aqueles em que as pessoas vão chorar e gritar", disse. Nas localidades onde há possibilidade de ocorrer um evento, representantes da defesa civil chegam a alertar a população para as consequência do tremor.
Maciel não ficou rico com a descoberta, como previa a brincadeira. Nem pretende. Repassa sua tese a quem se interessa por ela. Só lamenta haver estudiosos que o criticam –não por tentarem, sem sucesso, invalidar a pesquisa, mas por ele não ter diploma de geólogo. "Dizem que sou um ignorante sem nunca ter lido nada que escrevi."
Mas Maciel conseguiu um aliado: George França pesquisador do Observatório Geológico da Universidade de Brasília, que chegou publicar um trabalho em um congresso em parceria com o caçador de terremotos autodidata.
Segundo França, agora é a hora de fazer uma pausa estratégica na pesquisa. "Era importante que as postagens não continuassem até a pesquisa estar bem fundamentada", afirma. "O Aroldo é do povo, se preocupa com as pessoas. Quando ele apresenta suas ideias, a comunidade cientifica normalmente não as recebe porque falta comprovação. É supernormal isso."
Segundo ele, seria necessário que que a dupla estudasse geologia, geofísica ou até mesmo física para sustentar a pesquisa do autodidata. "Esse caminho midiático que existe no Chile atrapalha um pouco. O silêncio na hora certa para depois poder divulgar o estudo com maior comprovação é essencial", diz França.
O próprio operador ratifica as palavras do cientista da UnB. Diz que não consegue consegue acertar nem 70% dos casos, mas acha que esse percentual pode aumentar. "Nem sei o que é. Só sei que existe um fenômeno que precisa ser estudado. Meu limite vai até aqui. Mas sei que existe uma correlação", disse ele.
ROGÉRIO PAGNAN
ENVIADO ESPECIAL A CUIABÁ (MT)
EDUARDO GERAQUE
DE SÃO PAULO
28/05/2017 02h00
Desconhecido até mesmo em Cuiabá, onde mora há 22 anos, o operador de áudio Aroldo Maciel Máximo dos Santos, 44, é uma celebridade no Chile, onde chega a precisar de escolta para conseguir circular em locais públicos.
São mais de 400 mil seguidores nas redes sociais, entrevistas concedidas para quase todas as emissoras de TVs do país e até uma carta do ex-presidente chileno Sebastián Piñera com agradecimentos pelos serviços prestados àquela nação.
O motivo de tanto interesse dos chilenos: desde 2012, Maciel conseguiu antecipar –com antecedência de dias– a chegada de dez abalos sísmicos registrados no outro lado dos Andes. Todos eles com magnitude acima de 6 pontos na escala Richter.
O método que tenta entender o padrão dos tremores pelo mundo é polêmico inclusive entre os cientistas da área. É muito difícil cravar a existência de um único padrão.
Até hoje, os pesquisadores de abalos sísmicos são céticos. Para eles, é impossível prever com precisão quando virá um terremoto.
No Chile, marcado por frequentes abalos sísmicos, os serviços de monitoramento registraram, em 200 anos, 97 terremotos de magnitude acima de 7 pontos na escala Richter.
Destes, 18 eventos, acima da magnitude 8, foram classificados como altamente destrutivos pelos estudiosos.
O último evento antecipado pelo brasileiro, de 6,9 pontos, atingiu a região de Valparaíso em 24 de abril. Maciel falava ao telefone com apresentadores de uma TV local sobre o sismo quando ele ocorreu.
A história do operador é ainda mais inusitada porque ele jamais havia estudado geologia –ou área correlata– para conseguir desenvolver a tese que defende.
"Acho que isso até ajudou. Se eu tivesse estudado, talvez não acreditasse que existe algo além de placas tectônicas", diz. "O conhecimento é baseado no que outras pessoas estudaram. Então, se você já tem uma opinião formada, não quer saber de outra verdade."
Ele descobriu um padrão de eventos pesquisando sozinho em um site que monitora tremores em todo o planeta. Imprimiu relatórios de eventos que ocorreram em um intervalo de dez anos, um calhamaço, e passou a analisar os eventos de maior intensidade.
Maciel diz ter chorado quando viu a existência de um padrão. "Imagina você se sentir um nada... Não tinha estudo, não tinha droga nenhuma. Aí você descobre uma coisa e vê que aquilo é grandioso. E numa brincadeira."
Brincadeira porque, segundo ele, a ideia surgiu em um churrasco entre amigos.
Cada um falou uma ideia de como pretendia ficar milionário e Maciel não tinha nenhuma. Uma amiga sugeriu a ideia "impossível" de um serviço de previsão de terremotos.
A tese de Maciel, já apresentada de forma semelhante por outros pesquisadores, é a de que os grandes terremotos seguem um padrão: caminham em linha reta de um ponto a outro, com intervalo de dias dependendo da magnitude do evento.
De um continente ao outro, a velocidade é algo em torno de 155 quilômetros por dia, dependendo da magnitude. Além do Chile, conseguiu, segundo ele, antecipar tremores na Espanha, na Turquia, Equador e no Peru.
O operador continua seu monitoramento e publica nas redes sociais quando há risco de tremores. "Eu só publico aqueles em que as pessoas vão chorar e gritar", disse. Nas localidades onde há possibilidade de ocorrer um evento, representantes da defesa civil chegam a alertar a população para as consequência do tremor.
Maciel não ficou rico com a descoberta, como previa a brincadeira. Nem pretende. Repassa sua tese a quem se interessa por ela. Só lamenta haver estudiosos que o criticam –não por tentarem, sem sucesso, invalidar a pesquisa, mas por ele não ter diploma de geólogo. "Dizem que sou um ignorante sem nunca ter lido nada que escrevi."
Mas Maciel conseguiu um aliado: George França pesquisador do Observatório Geológico da Universidade de Brasília, que chegou publicar um trabalho em um congresso em parceria com o caçador de terremotos autodidata.
Segundo França, agora é a hora de fazer uma pausa estratégica na pesquisa. "Era importante que as postagens não continuassem até a pesquisa estar bem fundamentada", afirma. "O Aroldo é do povo, se preocupa com as pessoas. Quando ele apresenta suas ideias, a comunidade cientifica normalmente não as recebe porque falta comprovação. É supernormal isso."
Segundo ele, seria necessário que que a dupla estudasse geologia, geofísica ou até mesmo física para sustentar a pesquisa do autodidata. "Esse caminho midiático que existe no Chile atrapalha um pouco. O silêncio na hora certa para depois poder divulgar o estudo com maior comprovação é essencial", diz França.
O próprio operador ratifica as palavras do cientista da UnB. Diz que não consegue consegue acertar nem 70% dos casos, mas acha que esse percentual pode aumentar. "Nem sei o que é. Só sei que existe um fenômeno que precisa ser estudado. Meu limite vai até aqui. Mas sei que existe uma correlação", disse ele.
ONU e comissão internacional criticam ações policiais na cracolândia e no DF
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2017/05/1887685-onu-e-comissao-internacional-criticam-acoes-policiais-na-cracolandia-e-no-df.shtml
DE SÃO PAULO
26/05/2017 16h47 - Atualizado às 18h35
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) criticaram, em comunicado divulgado nesta sexta-feira (26), o uso excessivo da força policial na remoção de usuários de drogas na cracolândia, em São Paulo.
CIDH e ACNUDH também criticaram a ação contra os protestos de quarta-feira (24) pela saída do presidente Michel Temer, em Brasília, no Distrito Federal. Os organismos são braços do sistema internacional de promoção e proteção de garantias humanitárias.
As autoridades internacionais afirmaram que várias pessoas se feriram durante a operação de segurança em São Paulo realizada pelas administrações de João Doria (PSDB) e Geraldo Alckmin (PSDB), no último domingo (23). As gestões municipal e estadual contestam e dizem que não houve feridos na ação.
"Buscamos garantir os direitos humanos em uma situação bastante delicada no Brasil neste momento", afirmou James Cavallaro, relator da CIDH para o Brasil.
A declaração dos organismos foi uma resposta à denúncia feita em audiência, na quinta-feira (25), pelas organizações civis Plataforma Brasileira de Políticas sobre Drogas e Conectas Direitos Humanos que tratou, entre outros temas, da operação policial na cracolândia.
A Plataforma e a Conectas pediram "que o Governo do Estado de São Paulo e a prefeitura de São Paulo parem imediatamente com a ação violenta sobre o local e retome políticas de assistência social, habitação e assistência à saúde das pessoas usuárias de drogas na região".
Questionados sobre a denúncia feita contra as duas administrações, o governo estadual e a prefeitura declararam, em nota, que "trata-se de posição assumida por quem não tem compromisso com a dignidade humana ou com a resolução do grave problema social".
BRASÍLIA
Os organismos internacionais ainda cobraram o governo federal a responder com diálogo e proteger o direito à manifestação. Elas criticaram a forma como as autoridades brasileiras responderam ao ato de centrais sindicais e movimentos sociais contra as reformas Trabalhista e da Previdência e Michel Temer, na quarta, em Brasília.
O Ministro da Defesa chegou, na ocasião, a convocar o exército para fazer a segurança da Esplanada dos Ministérios, no local dos protestos, com autorização do presidente da República.
O chefe GSI (Gabinete de Segurança Institucional) da Presidência, Sérgio Etchegoyen, classificou como "criminosos" e pessoas com quem "não se pode conversar" manifestantes que participaram de depredações e vandalismos na quarta.
CIDH e ACNUDH, ao mesmo tempo, disseram não concordar com os atos de violência dos manifestantes, pedindo que o direito à livre expressão seja exercido de forma pacífica, e afirmaram que a ação das forças de segurança deve respeitar em todo momento as normas internacionais de direitos humanos.
"Urgimos ao governo brasileiro a cumprir com suas obrigações internacionais em matéria de direitos humanos. Isto inclui garantir o direito à manifestação e adotar políticas públicas que tenham como prioridade o respeito e a garantia do direito à vida, à integridade pessoal e outros direitos fundamentais", acrescentou Cavallaro, da CIDH.
RESPOSTA
Em nota divulgada na tarde desta sexta-feira, o governo repudiou "nos mais fortes termos, o teor desinformado e tendencioso do comunicado do ACNUDH e da CIDH". Segundo ela, o texto "quer induzir a crer que o Brasil não dispõe de instituições sólidas, dedicadas à proteção dos direitos humanos".
"Em momento algum os autores da nota se preocuparam com a ameaça à segurança de funcionários públicos e de manifestantes pacíficos sujeitos a violência sistemática e claramente premeditada", diz o governo. Na nota, afirma também que as ações de quarta-feira foram organizadas por criminosos, que depredaram prédios e colocaram pessoas em risco.
O governo também critica o fato de o mesmo texto citar o episódio de violência agrária no sul do Pará "que não tem qualquer relação com os acontecimentos do dia 24" e a ação das autoridades de São Paulo na cracolândia "que tampouco guarda relação com o ocorrido em Brasília", dizendo que os episódios são incluídos ali "cinicamente e fora de contexto, para fins políticos inconfessáveis".
DE SÃO PAULO
26/05/2017 16h47 - Atualizado às 18h35
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) criticaram, em comunicado divulgado nesta sexta-feira (26), o uso excessivo da força policial na remoção de usuários de drogas na cracolândia, em São Paulo.
CIDH e ACNUDH também criticaram a ação contra os protestos de quarta-feira (24) pela saída do presidente Michel Temer, em Brasília, no Distrito Federal. Os organismos são braços do sistema internacional de promoção e proteção de garantias humanitárias.
As autoridades internacionais afirmaram que várias pessoas se feriram durante a operação de segurança em São Paulo realizada pelas administrações de João Doria (PSDB) e Geraldo Alckmin (PSDB), no último domingo (23). As gestões municipal e estadual contestam e dizem que não houve feridos na ação.
"Buscamos garantir os direitos humanos em uma situação bastante delicada no Brasil neste momento", afirmou James Cavallaro, relator da CIDH para o Brasil.
A declaração dos organismos foi uma resposta à denúncia feita em audiência, na quinta-feira (25), pelas organizações civis Plataforma Brasileira de Políticas sobre Drogas e Conectas Direitos Humanos que tratou, entre outros temas, da operação policial na cracolândia.
A Plataforma e a Conectas pediram "que o Governo do Estado de São Paulo e a prefeitura de São Paulo parem imediatamente com a ação violenta sobre o local e retome políticas de assistência social, habitação e assistência à saúde das pessoas usuárias de drogas na região".
Questionados sobre a denúncia feita contra as duas administrações, o governo estadual e a prefeitura declararam, em nota, que "trata-se de posição assumida por quem não tem compromisso com a dignidade humana ou com a resolução do grave problema social".
BRASÍLIA
Os organismos internacionais ainda cobraram o governo federal a responder com diálogo e proteger o direito à manifestação. Elas criticaram a forma como as autoridades brasileiras responderam ao ato de centrais sindicais e movimentos sociais contra as reformas Trabalhista e da Previdência e Michel Temer, na quarta, em Brasília.
O Ministro da Defesa chegou, na ocasião, a convocar o exército para fazer a segurança da Esplanada dos Ministérios, no local dos protestos, com autorização do presidente da República.
O chefe GSI (Gabinete de Segurança Institucional) da Presidência, Sérgio Etchegoyen, classificou como "criminosos" e pessoas com quem "não se pode conversar" manifestantes que participaram de depredações e vandalismos na quarta.
CIDH e ACNUDH, ao mesmo tempo, disseram não concordar com os atos de violência dos manifestantes, pedindo que o direito à livre expressão seja exercido de forma pacífica, e afirmaram que a ação das forças de segurança deve respeitar em todo momento as normas internacionais de direitos humanos.
"Urgimos ao governo brasileiro a cumprir com suas obrigações internacionais em matéria de direitos humanos. Isto inclui garantir o direito à manifestação e adotar políticas públicas que tenham como prioridade o respeito e a garantia do direito à vida, à integridade pessoal e outros direitos fundamentais", acrescentou Cavallaro, da CIDH.
RESPOSTA
Em nota divulgada na tarde desta sexta-feira, o governo repudiou "nos mais fortes termos, o teor desinformado e tendencioso do comunicado do ACNUDH e da CIDH". Segundo ela, o texto "quer induzir a crer que o Brasil não dispõe de instituições sólidas, dedicadas à proteção dos direitos humanos".
"Em momento algum os autores da nota se preocuparam com a ameaça à segurança de funcionários públicos e de manifestantes pacíficos sujeitos a violência sistemática e claramente premeditada", diz o governo. Na nota, afirma também que as ações de quarta-feira foram organizadas por criminosos, que depredaram prédios e colocaram pessoas em risco.
O governo também critica o fato de o mesmo texto citar o episódio de violência agrária no sul do Pará "que não tem qualquer relação com os acontecimentos do dia 24" e a ação das autoridades de São Paulo na cracolândia "que tampouco guarda relação com o ocorrido em Brasília", dizendo que os episódios são incluídos ali "cinicamente e fora de contexto, para fins políticos inconfessáveis".
29 anos depois, parque olímpico de Seul vira point e área competitiva
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/esporte/2017/05/1888097-29-anos-depois-parque-olimpico-de-seul-vira-point-e-area-competitiva.shtml
PAULO ROBERTO CONDE
ENVIADO ESPECIAL A SEUL (COREIA DO SUL)
28/05/2017 02h00
Enquanto o legado dos Jogos Olímpicos do Rio está em xeque menos de um ano após o seu término, no outro extremo do planeta o clima é diametralmente oposto.
Seul, capital da Coreia do Sul, organiza para 2018 uma série de eventos para marcar os 30 anos de vida das reminiscências, estruturais e emocionais, dos Jogos de 1988.
Autoridades pretendem fazer competições e festivais culturais para enaltecer a data.
Mais marcante que a celebração em si é o cuidado com que os asiáticos tratam o que restou da Olimpíada.
O gigantesco Parque Olímpico de 1,4 milhão de metros quadrados está aberto desde 1986 e conserva seus equipamentos em excelente estado.
As instalações que receberam provas de natação, tênis, levantamento de peso, ciclismo e ginásticas circundam uma área verde onde no passado ficava uma fortaleza. Duas linhas de metrô alimentam o vaivém de pessoas.
A entrada é pela Praça da Paz, onde monumento em formato de asa e com os simbólicos anéis marcam o ingresso em território olímpico.
De acordo com a KSPO (Korea Sports Promotion Foundation), agência pública que administra o espaço, estima-se que sete milhões de visitantes vão ao parque todos os anos –o acesso é gratuito.
Outras 430 mil pessoas vão ao local para usar os equipamentos esportivos mantidos desde os Jogos de 1988.
Elas pagam taxas para poder se exercitar no Centro Aquático, que há anos deixou de ser "apenas" a piscina.
PRESERVADOParque olímpico de 1988 segue em ótimas condições
PRESERVADO - Parque olímpico de 1988 segue em ótimas condições
O empreendimento, que a Folha visitou em abril, é interligado com o hall de ginástica por acesso subterrâneo. Juntos, os dois equipamentos têm espaço para receber 16 modalidades, academias, cafés e mais serviços.
A piscina, que abriga aulas e competições e foi reparada algumas vezes, parece intacta –mantém o placar de 1988.
"Temos três objetivos com o parque: abri-lo como espaço de ecoambiente, oferecer os centros esportivos para os cidadãos e incentivar a área cultural", afirmou Shi-hoon Kim, assistente da equipe de planejamento da KSPO.
Para ter acesso ao que é oferecido, um munícipe paga cerca de R$ 260 mensais. Kim disse que, na comparação com academias particulares, o valor é "competitivo". "Temos fila de interessados."
O Parque Olímpico ainda tem mais de 200 esculturas produzidas por artistas locais e do exterior em sua área.
Obviamente, também há problemas na administração.
Somente os valores cobrados pelas entradas do público não cobrem os gastos.
"Precisamos atender às demandas do público e sempre tentamos novas formas de captar dinheiro. As instalações ficam corroídas e precisam de conservação. Por isso, 10% do faturamento é para manutenção", disse.
O que garante a viabilidade do parque é a locação de dois halls para até 15 mil pessoas para concertos, sobretudo do chamado K-Pop, festival com astros pop do país.
Uma atração dentro do coração de Seul-1988 é o museu aberto em setembro de 1990, dois anos após o evento.
Em três andares, é possível ver tochas de Olimpíadas passadas, medalhas doadas por atletas coreanos e tudo sobre os Jogos, da candidatura ao dia a dia da competição.
O acesso ao acervo, também mantido pela KSPO, é gratuito. A média de visitantes, segundo Jae-kyu Kim, que trabalha na administração, é de 200 mil pessoas por ano.
Ele pertence a uma rede de museus ao redor do mundo com memorabilia olímpica certificada pelo COI (Comitê Olímpico Internacional).
"Este museu tem por objetivo educar. Queremos que as próximas gerações não se esqueçam de 1988", disse.
Mantê-lo custa R$ 558 mil à agência pública todo ano. Como o acesso é gratuito, a solução para torná-lo sadio nas finanças é promover eventos.
Em 2018, essas ativações devem surgir aos montes em comemoração aos 30 anos.
O jornalista PAULO ROBERTO CONDE viajou a convite do Ministério da Cultura, Esporte e Turismo da Coreia do Sul
PAULO ROBERTO CONDE
ENVIADO ESPECIAL A SEUL (COREIA DO SUL)
28/05/2017 02h00
Enquanto o legado dos Jogos Olímpicos do Rio está em xeque menos de um ano após o seu término, no outro extremo do planeta o clima é diametralmente oposto.
Seul, capital da Coreia do Sul, organiza para 2018 uma série de eventos para marcar os 30 anos de vida das reminiscências, estruturais e emocionais, dos Jogos de 1988.
Autoridades pretendem fazer competições e festivais culturais para enaltecer a data.
Mais marcante que a celebração em si é o cuidado com que os asiáticos tratam o que restou da Olimpíada.
O gigantesco Parque Olímpico de 1,4 milhão de metros quadrados está aberto desde 1986 e conserva seus equipamentos em excelente estado.
As instalações que receberam provas de natação, tênis, levantamento de peso, ciclismo e ginásticas circundam uma área verde onde no passado ficava uma fortaleza. Duas linhas de metrô alimentam o vaivém de pessoas.
A entrada é pela Praça da Paz, onde monumento em formato de asa e com os simbólicos anéis marcam o ingresso em território olímpico.
De acordo com a KSPO (Korea Sports Promotion Foundation), agência pública que administra o espaço, estima-se que sete milhões de visitantes vão ao parque todos os anos –o acesso é gratuito.
Outras 430 mil pessoas vão ao local para usar os equipamentos esportivos mantidos desde os Jogos de 1988.
Elas pagam taxas para poder se exercitar no Centro Aquático, que há anos deixou de ser "apenas" a piscina.
PRESERVADOParque olímpico de 1988 segue em ótimas condições
PRESERVADO - Parque olímpico de 1988 segue em ótimas condições
O empreendimento, que a Folha visitou em abril, é interligado com o hall de ginástica por acesso subterrâneo. Juntos, os dois equipamentos têm espaço para receber 16 modalidades, academias, cafés e mais serviços.
A piscina, que abriga aulas e competições e foi reparada algumas vezes, parece intacta –mantém o placar de 1988.
"Temos três objetivos com o parque: abri-lo como espaço de ecoambiente, oferecer os centros esportivos para os cidadãos e incentivar a área cultural", afirmou Shi-hoon Kim, assistente da equipe de planejamento da KSPO.
Para ter acesso ao que é oferecido, um munícipe paga cerca de R$ 260 mensais. Kim disse que, na comparação com academias particulares, o valor é "competitivo". "Temos fila de interessados."
O Parque Olímpico ainda tem mais de 200 esculturas produzidas por artistas locais e do exterior em sua área.
Obviamente, também há problemas na administração.
Somente os valores cobrados pelas entradas do público não cobrem os gastos.
"Precisamos atender às demandas do público e sempre tentamos novas formas de captar dinheiro. As instalações ficam corroídas e precisam de conservação. Por isso, 10% do faturamento é para manutenção", disse.
O que garante a viabilidade do parque é a locação de dois halls para até 15 mil pessoas para concertos, sobretudo do chamado K-Pop, festival com astros pop do país.
Uma atração dentro do coração de Seul-1988 é o museu aberto em setembro de 1990, dois anos após o evento.
Em três andares, é possível ver tochas de Olimpíadas passadas, medalhas doadas por atletas coreanos e tudo sobre os Jogos, da candidatura ao dia a dia da competição.
O acesso ao acervo, também mantido pela KSPO, é gratuito. A média de visitantes, segundo Jae-kyu Kim, que trabalha na administração, é de 200 mil pessoas por ano.
Ele pertence a uma rede de museus ao redor do mundo com memorabilia olímpica certificada pelo COI (Comitê Olímpico Internacional).
"Este museu tem por objetivo educar. Queremos que as próximas gerações não se esqueçam de 1988", disse.
Mantê-lo custa R$ 558 mil à agência pública todo ano. Como o acesso é gratuito, a solução para torná-lo sadio nas finanças é promover eventos.
Em 2018, essas ativações devem surgir aos montes em comemoração aos 30 anos.
O jornalista PAULO ROBERTO CONDE viajou a convite do Ministério da Cultura, Esporte e Turismo da Coreia do Sul
Tempos estranhos
Fonte: www1.folha.uol.com.br/colunas/lira-neto/2017/05/1887757-tempos-estranhos.shtml
Por Lira Neto
28/05/2017 02h00 - Atualizado em 29/05/2017 às 17h52
Cena 1: Um batalhão de soldados aparelhados de fuzis investe contra a multidão, deixando atrás de si um rastro de destruição e brutalidade. As paredes das habitações coletivas são demolidas com violência, embora lá dentro ainda existam moradores que não tiveram para onde ir nem oportunidade de correr. Em meio aos estampidos, entre nuvens de fumaça e poeira, homens, mulheres e até crianças fogem atarantados, sem direção definida. Pela imprensa, o prefeito comemora, minimizando a ocorrência de feridos e desabrigados.
Essa bem que poderia ser uma narrativa do final do século 19. A descrição da derrubada do Cabeça de Porco, por exemplo, o maior cortiço do Rio à época. Um episódio ocorrido no tempo em que questões sociais e de saúde pública eram tratadas pelas autoridades a bala, como caso de polícia. O prefeito carioca de então, Barata Ribeiro, definira aquela ação armada como medida civilizatória, cruzada em nome da ordem e do progresso. Resultado do imbróglio: pessoas em situação de extremo risco, desalojadas à força, ocuparam as encostas dos morros vizinhos, dando origem às primeiras favelas do país.
Infelizmente, custa crer, tal barbárie não faz parte do passado. Não à toa, os tempos verbais do primeiro parágrafo deste texto estão todos no presente. O absurdo da cena deu-se há poucos dias, século 21, no coração da cidade mais rica e desenvolvida do país. A pretexto de exterminar a cracolândia, uma megaoperação posta em prática em São Paulo apenas conseguiu espalhar um problema que já era crônico por outras regiões da cidade. Mais de cem anos antes, um jornal carioca, "O Paiz", indagara a Barata Ribeiro: "A cabeça está decepada, mas o rabo, toda essa cauda de expulsos que trazeis atrás, onde a acomodareis?"
Cena 2: Ao tomar posse de um cargo público, um sujeito relativamente jovem e que diz representar o "novo" trombeteia discurso supostamente moderno, pregando a primazia da eficiência administrativa sobre as contingências do fazer político. A demonização da política e dos políticos profissionais é, quase sempre, a tônica de seus pronunciamentos e entrevistas. A imprensa compra a ideia e propaga a imagem de um líder jovial, capaz de fazer uma gestão baseada na excelência técnica e na impessoalidade das decisões.
Dessa vez, o que parece ser uma cena atual, é antiquíssima. O parágrafo acima descreve os instantes iniciais da chegada de Getúlio Vargas ao poder, em 1930, após a vitória da chamada Revolução de 30. Instalado no governo, Getúlio fez valer a potoca de que não era político "embora tivesse ocupado vários cargos públicos ao longo da vida" e apresentou-se à sociedade como um renovador dos costumes. Ele, que se gabava de acordar cedo e trabalhar muito, utilizou-se da insatisfação popular contra os políticos para implantar um governo autoritário, que desdenhava a democracia e flertava com os regimes fascistas que então despontavam na Europa.
Na revista "Careta", uma charge publicada em novembro daquele ano mostrava a imagem de uma bruxa, personificação da política, morta, pendurada na forca. "Tomara que essa megera não tenha deixado filhos por aí", dizia o carrasco.
Impressiona que, mesmo depois de a história demonstrar que a tentação totalitária se esconde por trás desse tipo de mensagem, há quem ainda pretenda adotá-la como sinônimo de modernidade.
Cena 3: Antes de se apresentarem para o público, vários artistas recebem a mesma advertência, por escrito, deixada sobre as mesas dos respectivos camarins. Todos eles são avisados de que, caso não se resumam a tocar e cantar, evitando assim qualquer comentário ou manifestação de ordem política, a prefeitura estará sujeita às penas determinadas pelas autoridades promotoras da ameaça. O responsável por transmitir a informação, numa frase que já se ouviu inúmeras vezes ao longo da história, lava as mãos e declara que está apenas repassando ordens dos poderes situados acima dele.
Nesse caso, seria possível imaginar a cena em qualquer ditadura sanguinária, uma autocracia que imponha a censura às manifestações culturais e persiga artistas e intelectuais como insidiosos inimigos. Não. Ocorreu, também, em São Paulo, na Virada Cultural, por determinação de uma representante do Ministério Público, órgão que em tese teria o dever de atuar em defesa da democracia e de zelar pelos direitos constitucionais, que preveem ampla liberdade de expressão e opinião. Tempos estranhos. Tempos sombrios.
Por Lira Neto
28/05/2017 02h00 - Atualizado em 29/05/2017 às 17h52
Cena 1: Um batalhão de soldados aparelhados de fuzis investe contra a multidão, deixando atrás de si um rastro de destruição e brutalidade. As paredes das habitações coletivas são demolidas com violência, embora lá dentro ainda existam moradores que não tiveram para onde ir nem oportunidade de correr. Em meio aos estampidos, entre nuvens de fumaça e poeira, homens, mulheres e até crianças fogem atarantados, sem direção definida. Pela imprensa, o prefeito comemora, minimizando a ocorrência de feridos e desabrigados.
Essa bem que poderia ser uma narrativa do final do século 19. A descrição da derrubada do Cabeça de Porco, por exemplo, o maior cortiço do Rio à época. Um episódio ocorrido no tempo em que questões sociais e de saúde pública eram tratadas pelas autoridades a bala, como caso de polícia. O prefeito carioca de então, Barata Ribeiro, definira aquela ação armada como medida civilizatória, cruzada em nome da ordem e do progresso. Resultado do imbróglio: pessoas em situação de extremo risco, desalojadas à força, ocuparam as encostas dos morros vizinhos, dando origem às primeiras favelas do país.
Infelizmente, custa crer, tal barbárie não faz parte do passado. Não à toa, os tempos verbais do primeiro parágrafo deste texto estão todos no presente. O absurdo da cena deu-se há poucos dias, século 21, no coração da cidade mais rica e desenvolvida do país. A pretexto de exterminar a cracolândia, uma megaoperação posta em prática em São Paulo apenas conseguiu espalhar um problema que já era crônico por outras regiões da cidade. Mais de cem anos antes, um jornal carioca, "O Paiz", indagara a Barata Ribeiro: "A cabeça está decepada, mas o rabo, toda essa cauda de expulsos que trazeis atrás, onde a acomodareis?"
Cena 2: Ao tomar posse de um cargo público, um sujeito relativamente jovem e que diz representar o "novo" trombeteia discurso supostamente moderno, pregando a primazia da eficiência administrativa sobre as contingências do fazer político. A demonização da política e dos políticos profissionais é, quase sempre, a tônica de seus pronunciamentos e entrevistas. A imprensa compra a ideia e propaga a imagem de um líder jovial, capaz de fazer uma gestão baseada na excelência técnica e na impessoalidade das decisões.
Dessa vez, o que parece ser uma cena atual, é antiquíssima. O parágrafo acima descreve os instantes iniciais da chegada de Getúlio Vargas ao poder, em 1930, após a vitória da chamada Revolução de 30. Instalado no governo, Getúlio fez valer a potoca de que não era político "embora tivesse ocupado vários cargos públicos ao longo da vida" e apresentou-se à sociedade como um renovador dos costumes. Ele, que se gabava de acordar cedo e trabalhar muito, utilizou-se da insatisfação popular contra os políticos para implantar um governo autoritário, que desdenhava a democracia e flertava com os regimes fascistas que então despontavam na Europa.
Na revista "Careta", uma charge publicada em novembro daquele ano mostrava a imagem de uma bruxa, personificação da política, morta, pendurada na forca. "Tomara que essa megera não tenha deixado filhos por aí", dizia o carrasco.
Impressiona que, mesmo depois de a história demonstrar que a tentação totalitária se esconde por trás desse tipo de mensagem, há quem ainda pretenda adotá-la como sinônimo de modernidade.
Cena 3: Antes de se apresentarem para o público, vários artistas recebem a mesma advertência, por escrito, deixada sobre as mesas dos respectivos camarins. Todos eles são avisados de que, caso não se resumam a tocar e cantar, evitando assim qualquer comentário ou manifestação de ordem política, a prefeitura estará sujeita às penas determinadas pelas autoridades promotoras da ameaça. O responsável por transmitir a informação, numa frase que já se ouviu inúmeras vezes ao longo da história, lava as mãos e declara que está apenas repassando ordens dos poderes situados acima dele.
Nesse caso, seria possível imaginar a cena em qualquer ditadura sanguinária, uma autocracia que imponha a censura às manifestações culturais e persiga artistas e intelectuais como insidiosos inimigos. Não. Ocorreu, também, em São Paulo, na Virada Cultural, por determinação de uma representante do Ministério Público, órgão que em tese teria o dever de atuar em defesa da democracia e de zelar pelos direitos constitucionais, que preveem ampla liberdade de expressão e opinião. Tempos estranhos. Tempos sombrios.
Tempos estranhos
Fonte: www1.folha.uol.com.br/colunas/lira-neto/2017/05/1887757-tempos-estranhos.shtml
Por Lira Neto
28/05/2017 02h00 - Atualizado em 29/05/2017 às 17h52
Cena 1: Um batalhão de soldados aparelhados de fuzis investe contra a multidão, deixando atrás de si um rastro de destruição e brutalidade. As paredes das habitações coletivas são demolidas com violência, embora lá dentro ainda existam moradores que não tiveram para onde ir nem oportunidade de correr. Em meio aos estampidos, entre nuvens de fumaça e poeira, homens, mulheres e até crianças fogem atarantados, sem direção definida. Pela imprensa, o prefeito comemora, minimizando a ocorrência de feridos e desabrigados.
Essa bem que poderia ser uma narrativa do final do século 19. A descrição da derrubada do Cabeça de Porco, por exemplo, o maior cortiço do Rio à época. Um episódio ocorrido no tempo em que questões sociais e de saúde pública eram tratadas pelas autoridades a bala, como caso de polícia. O prefeito carioca de então, Barata Ribeiro, definira aquela ação armada como medida civilizatória, cruzada em nome da ordem e do progresso. Resultado do imbróglio: pessoas em situação de extremo risco, desalojadas à força, ocuparam as encostas dos morros vizinhos, dando origem às primeiras favelas do país.
Infelizmente, custa crer, tal barbárie não faz parte do passado. Não à toa, os tempos verbais do primeiro parágrafo deste texto estão todos no presente. O absurdo da cena deu-se há poucos dias, século 21, no coração da cidade mais rica e desenvolvida do país. A pretexto de exterminar a cracolândia, uma megaoperação posta em prática em São Paulo apenas conseguiu espalhar um problema que já era crônico por outras regiões da cidade. Mais de cem anos antes, um jornal carioca, "O Paiz", indagara a Barata Ribeiro: "A cabeça está decepada, mas o rabo, toda essa cauda de expulsos que trazeis atrás, onde a acomodareis?"
Cena 2: Ao tomar posse de um cargo público, um sujeito relativamente jovem e que diz representar o "novo" trombeteia discurso supostamente moderno, pregando a primazia da eficiência administrativa sobre as contingências do fazer político. A demonização da política e dos políticos profissionais é, quase sempre, a tônica de seus pronunciamentos e entrevistas. A imprensa compra a ideia e propaga a imagem de um líder jovial, capaz de fazer uma gestão baseada na excelência técnica e na impessoalidade das decisões.
Dessa vez, o que parece ser uma cena atual, é antiquíssima. O parágrafo acima descreve os instantes iniciais da chegada de Getúlio Vargas ao poder, em 1930, após a vitória da chamada Revolução de 30. Instalado no governo, Getúlio fez valer a potoca de que não era político "embora tivesse ocupado vários cargos públicos ao longo da vida" e apresentou-se à sociedade como um renovador dos costumes. Ele, que se gabava de acordar cedo e trabalhar muito, utilizou-se da insatisfação popular contra os políticos para implantar um governo autoritário, que desdenhava a democracia e flertava com os regimes fascistas que então despontavam na Europa.
Na revista "Careta", uma charge publicada em novembro daquele ano mostrava a imagem de uma bruxa, personificação da política, morta, pendurada na forca. "Tomara que essa megera não tenha deixado filhos por aí", dizia o carrasco.
Impressiona que, mesmo depois de a história demonstrar que a tentação totalitária se esconde por trás desse tipo de mensagem, há quem ainda pretenda adotá-la como sinônimo de modernidade.
Cena 3: Antes de se apresentarem para o público, vários artistas recebem a mesma advertência, por escrito, deixada sobre as mesas dos respectivos camarins. Todos eles são avisados de que, caso não se resumam a tocar e cantar, evitando assim qualquer comentário ou manifestação de ordem política, a prefeitura estará sujeita às penas determinadas pelas autoridades promotoras da ameaça. O responsável por transmitir a informação, numa frase que já se ouviu inúmeras vezes ao longo da história, lava as mãos e declara que está apenas repassando ordens dos poderes situados acima dele.
Nesse caso, seria possível imaginar a cena em qualquer ditadura sanguinária, uma autocracia que imponha a censura às manifestações culturais e persiga artistas e intelectuais como insidiosos inimigos. Não. Ocorreu, também, em São Paulo, na Virada Cultural, por determinação de uma representante do Ministério Público, órgão que em tese teria o dever de atuar em defesa da democracia e de zelar pelos direitos constitucionais, que preveem ampla liberdade de expressão e opinião. Tempos estranhos. Tempos sombrios.
Por Lira Neto
28/05/2017 02h00 - Atualizado em 29/05/2017 às 17h52
Cena 1: Um batalhão de soldados aparelhados de fuzis investe contra a multidão, deixando atrás de si um rastro de destruição e brutalidade. As paredes das habitações coletivas são demolidas com violência, embora lá dentro ainda existam moradores que não tiveram para onde ir nem oportunidade de correr. Em meio aos estampidos, entre nuvens de fumaça e poeira, homens, mulheres e até crianças fogem atarantados, sem direção definida. Pela imprensa, o prefeito comemora, minimizando a ocorrência de feridos e desabrigados.
Essa bem que poderia ser uma narrativa do final do século 19. A descrição da derrubada do Cabeça de Porco, por exemplo, o maior cortiço do Rio à época. Um episódio ocorrido no tempo em que questões sociais e de saúde pública eram tratadas pelas autoridades a bala, como caso de polícia. O prefeito carioca de então, Barata Ribeiro, definira aquela ação armada como medida civilizatória, cruzada em nome da ordem e do progresso. Resultado do imbróglio: pessoas em situação de extremo risco, desalojadas à força, ocuparam as encostas dos morros vizinhos, dando origem às primeiras favelas do país.
Infelizmente, custa crer, tal barbárie não faz parte do passado. Não à toa, os tempos verbais do primeiro parágrafo deste texto estão todos no presente. O absurdo da cena deu-se há poucos dias, século 21, no coração da cidade mais rica e desenvolvida do país. A pretexto de exterminar a cracolândia, uma megaoperação posta em prática em São Paulo apenas conseguiu espalhar um problema que já era crônico por outras regiões da cidade. Mais de cem anos antes, um jornal carioca, "O Paiz", indagara a Barata Ribeiro: "A cabeça está decepada, mas o rabo, toda essa cauda de expulsos que trazeis atrás, onde a acomodareis?"
Cena 2: Ao tomar posse de um cargo público, um sujeito relativamente jovem e que diz representar o "novo" trombeteia discurso supostamente moderno, pregando a primazia da eficiência administrativa sobre as contingências do fazer político. A demonização da política e dos políticos profissionais é, quase sempre, a tônica de seus pronunciamentos e entrevistas. A imprensa compra a ideia e propaga a imagem de um líder jovial, capaz de fazer uma gestão baseada na excelência técnica e na impessoalidade das decisões.
Dessa vez, o que parece ser uma cena atual, é antiquíssima. O parágrafo acima descreve os instantes iniciais da chegada de Getúlio Vargas ao poder, em 1930, após a vitória da chamada Revolução de 30. Instalado no governo, Getúlio fez valer a potoca de que não era político "embora tivesse ocupado vários cargos públicos ao longo da vida" e apresentou-se à sociedade como um renovador dos costumes. Ele, que se gabava de acordar cedo e trabalhar muito, utilizou-se da insatisfação popular contra os políticos para implantar um governo autoritário, que desdenhava a democracia e flertava com os regimes fascistas que então despontavam na Europa.
Na revista "Careta", uma charge publicada em novembro daquele ano mostrava a imagem de uma bruxa, personificação da política, morta, pendurada na forca. "Tomara que essa megera não tenha deixado filhos por aí", dizia o carrasco.
Impressiona que, mesmo depois de a história demonstrar que a tentação totalitária se esconde por trás desse tipo de mensagem, há quem ainda pretenda adotá-la como sinônimo de modernidade.
Cena 3: Antes de se apresentarem para o público, vários artistas recebem a mesma advertência, por escrito, deixada sobre as mesas dos respectivos camarins. Todos eles são avisados de que, caso não se resumam a tocar e cantar, evitando assim qualquer comentário ou manifestação de ordem política, a prefeitura estará sujeita às penas determinadas pelas autoridades promotoras da ameaça. O responsável por transmitir a informação, numa frase que já se ouviu inúmeras vezes ao longo da história, lava as mãos e declara que está apenas repassando ordens dos poderes situados acima dele.
Nesse caso, seria possível imaginar a cena em qualquer ditadura sanguinária, uma autocracia que imponha a censura às manifestações culturais e persiga artistas e intelectuais como insidiosos inimigos. Não. Ocorreu, também, em São Paulo, na Virada Cultural, por determinação de uma representante do Ministério Público, órgão que em tese teria o dever de atuar em defesa da democracia e de zelar pelos direitos constitucionais, que preveem ampla liberdade de expressão e opinião. Tempos estranhos. Tempos sombrios.
domingo, 28 de maio de 2017
Precisamos falar sobre Joesley
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/tatibernardi/2017/05/1887532-precisamos-falar-sobre-joesley.shtml
26/05/2017 02h00
Por Tati Bernardi
Compra de silêncio com obesas mesadas, superfaturamentos, patrocínio fraudulento de campanhas políticas, contas no exterior, encontro com o presidente na calada da noite, grosserias de um político coxinha narradas por um âncora almofadinha. Nada disso me soa mais patético e/ou escandaloso do que a história dos irmãos, Joesley e Wesley, que superaram a expectativa nominal de dupla sertaneja e decidiram leiloar o próprio país. Joesley fez mais do que cuspir na louça refinada em que comeu, ele mandou explodir a fábrica de pratos que já alimentou não apenas suas próximas dez gerações, mas os reis na barriga de muitos colegas. Se fosse uma ficção científica (e não é?), veríamos ele e sua família correndo para embarcar num jato particular enquanto destroços e labaredas raivosas não os atingem por meio segundo.
Apaixonado, com a intensidade e o exagero que somente os feiosos rejeitados do colégio podem sentir em vida adulta, celebrou seu casamento em três diferentes países, gastando cifras ainda maiores do que as relatadas (como se nada fossem) à Procuradoria-Geral. Rebento insaciável, mamou num BNDES duvidoso e, no meio da fartura, muito antes de ser o "geniopata" mais famoso do Brasil, tentou mudar a JBS para a Irlanda, paraíso fiscal. Psicopata boa praça, se mostrou sempre calmo e risonho, tanto ao grampear os comparsas quanto ao ser filmado expondo a lama que o encobriu. Maroto e bem assessorado, reza a lenda que espalhava carne barata pelo país, para abaixar o valor do boi. Qualquer semelhança nossa com seus gados não é mera coincidência.
E a sacanagem não para por aí. Foi visto, provavelmente enquanto planejava rifar sua nação como se fôssemos brinquedos vagabundos de quermesse, comprando mimos sexuais em NY com a sua belíssima cônjuge "jornalista premiada" que, em uma entrevista recente, quis falar "nesse meio tempo" e falou "nesse meio termo". A riqueza, pelo visto, traz mais do que a falta de preocupação com a gasolina. Seria seu bolo preferido o de dinheiro?
Lembra na época da ditadura, quando jovens eram violentados porque não entregavam os amiguinhos? Pois é, na delação premiada, tiozinhos são ostentados justamente por expor, grampear e cagar na cabeça dos camaradas. Nossas paredes estão forradas de cartazes "traga-nos a cabeça da República e ganhe uma vida livre e nababesca". Saudade de quando eram grafites. Saudade da época do colégio, quando eu achava que "leniência" tinha a ver com Lênin, o Vladimir. Ao saber do mandado de prisão do Maluf, senti nostalgia. Queria ter um Alf de pelúcia, um Pense Bem e um boneco de pano "Malufinho rouba, mas faz". Vendo em retrospecto, alguns bandidos da nossa infância chegam a ser fofos.
E agora, pós fuga lícita de Joesley, nós, pobres e moídos civis orgulhosos de declarar impostos e misturar uma carninha fraca no arroz, ficamos aqui nos perguntando quem são, onde vivem e do que se alimentam os juízes que mandaram prender os trutas carregadores de malas e não os tubarões que as confeccionaram com o couro arrancado de um país inteiro. A lição que fica, diariamente, é que se você for um merda, mas dedurar o bosta, estará livre para nunca mais voltar pro esgoto. Livre para recarregar dildos de última geração em uma cobertura na Quinta Avenida. Ou para rir com o vídeo desesperado do Aécio que, assim como quase toda atriz pornô ou participante de BBB, só queria comprar (ou vender?) uma casa para a pobre mãe.
26/05/2017 02h00
Por Tati Bernardi
Compra de silêncio com obesas mesadas, superfaturamentos, patrocínio fraudulento de campanhas políticas, contas no exterior, encontro com o presidente na calada da noite, grosserias de um político coxinha narradas por um âncora almofadinha. Nada disso me soa mais patético e/ou escandaloso do que a história dos irmãos, Joesley e Wesley, que superaram a expectativa nominal de dupla sertaneja e decidiram leiloar o próprio país. Joesley fez mais do que cuspir na louça refinada em que comeu, ele mandou explodir a fábrica de pratos que já alimentou não apenas suas próximas dez gerações, mas os reis na barriga de muitos colegas. Se fosse uma ficção científica (e não é?), veríamos ele e sua família correndo para embarcar num jato particular enquanto destroços e labaredas raivosas não os atingem por meio segundo.
Apaixonado, com a intensidade e o exagero que somente os feiosos rejeitados do colégio podem sentir em vida adulta, celebrou seu casamento em três diferentes países, gastando cifras ainda maiores do que as relatadas (como se nada fossem) à Procuradoria-Geral. Rebento insaciável, mamou num BNDES duvidoso e, no meio da fartura, muito antes de ser o "geniopata" mais famoso do Brasil, tentou mudar a JBS para a Irlanda, paraíso fiscal. Psicopata boa praça, se mostrou sempre calmo e risonho, tanto ao grampear os comparsas quanto ao ser filmado expondo a lama que o encobriu. Maroto e bem assessorado, reza a lenda que espalhava carne barata pelo país, para abaixar o valor do boi. Qualquer semelhança nossa com seus gados não é mera coincidência.
E a sacanagem não para por aí. Foi visto, provavelmente enquanto planejava rifar sua nação como se fôssemos brinquedos vagabundos de quermesse, comprando mimos sexuais em NY com a sua belíssima cônjuge "jornalista premiada" que, em uma entrevista recente, quis falar "nesse meio tempo" e falou "nesse meio termo". A riqueza, pelo visto, traz mais do que a falta de preocupação com a gasolina. Seria seu bolo preferido o de dinheiro?
Lembra na época da ditadura, quando jovens eram violentados porque não entregavam os amiguinhos? Pois é, na delação premiada, tiozinhos são ostentados justamente por expor, grampear e cagar na cabeça dos camaradas. Nossas paredes estão forradas de cartazes "traga-nos a cabeça da República e ganhe uma vida livre e nababesca". Saudade de quando eram grafites. Saudade da época do colégio, quando eu achava que "leniência" tinha a ver com Lênin, o Vladimir. Ao saber do mandado de prisão do Maluf, senti nostalgia. Queria ter um Alf de pelúcia, um Pense Bem e um boneco de pano "Malufinho rouba, mas faz". Vendo em retrospecto, alguns bandidos da nossa infância chegam a ser fofos.
E agora, pós fuga lícita de Joesley, nós, pobres e moídos civis orgulhosos de declarar impostos e misturar uma carninha fraca no arroz, ficamos aqui nos perguntando quem são, onde vivem e do que se alimentam os juízes que mandaram prender os trutas carregadores de malas e não os tubarões que as confeccionaram com o couro arrancado de um país inteiro. A lição que fica, diariamente, é que se você for um merda, mas dedurar o bosta, estará livre para nunca mais voltar pro esgoto. Livre para recarregar dildos de última geração em uma cobertura na Quinta Avenida. Ou para rir com o vídeo desesperado do Aécio que, assim como quase toda atriz pornô ou participante de BBB, só queria comprar (ou vender?) uma casa para a pobre mãe.
Juruna mostrou como se faz
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/bernardomellofranco/2017/05/1888039-juruna-mostrou-como-se-faz.shtml
28/05/2017 02h00
Por Bernardo Mello Franco
BRASÍLIA - Em outubro de 1984, o dublê de cacique e deputado Mario Juruna convocou a imprensa para fazer uma denúncia contra si mesmo. Ele havia recebido propina do empresário Calim Eid para votar em Paulo Maluf no Colégio Eleitoral.
O xavante se disse arrependido e foi ao banco devolver 30 milhões de cruzeiros. A imagem do índio engravatado atrás de uma pilha de dinheiro resumiu o vale-tudo que embalou a sucessão do general Figueiredo.
Como Tancredo Neves venceu a disputa, ninguém quis investigar as suspeitas de suborno e caixa dois. Eid seguiu carreira como operador do malufismo. Juruna ficou desacreditado e não conseguiu se reeleger.
Mais de três décadas depois, o Brasil discute a possível escolha de outro presidente sem o voto popular. O senador Tasso Jereissati e o deputado Rodrigo Maia despontam como favoritos numa eleição indireta.
Políticos da situação e empresários não aceitam falar em diretas. A aliança que apoiava Michel Temer quer ungir um candidato comprometido com as reformas liberais. A ordem é mudar o presidente sem mudar a alma do governo em decomposição.
Em meio às conversas, articula-se um grande acordo para salvar investigados da Lava Jato. Entre as ideias mais cotadas, estão a anistia ao caixa dois e a concessão de algum tipo de imunidade a Temer, que poderia se estender a outros ex-presidentes.
Pelo roteiro das indiretas, o próximo inquilino do Planalto será escolhido por 513 deputados e 81 senadores. Boa parte deles é investigada sob suspeita de vender projetos de lei, MPs e outras mercadorias menos valiosas que a cadeira presidencial.
Nas últimas vezes que a turma elegeu os chefes da Câmara e do Senado, venceram Eduardo Cunha, Renan Calheiros, Rodrigo Maia e Eunício Oliveira. Todos delatados na Lava Jato.
Além de mostrar o que acontece numa eleição indireta, Juruna ensinou a usar o gravador em conversas com políticos. O cacique era atrapalhado, mas sabia das coisas.
28/05/2017 02h00
Por Bernardo Mello Franco
BRASÍLIA - Em outubro de 1984, o dublê de cacique e deputado Mario Juruna convocou a imprensa para fazer uma denúncia contra si mesmo. Ele havia recebido propina do empresário Calim Eid para votar em Paulo Maluf no Colégio Eleitoral.
O xavante se disse arrependido e foi ao banco devolver 30 milhões de cruzeiros. A imagem do índio engravatado atrás de uma pilha de dinheiro resumiu o vale-tudo que embalou a sucessão do general Figueiredo.
Como Tancredo Neves venceu a disputa, ninguém quis investigar as suspeitas de suborno e caixa dois. Eid seguiu carreira como operador do malufismo. Juruna ficou desacreditado e não conseguiu se reeleger.
Mais de três décadas depois, o Brasil discute a possível escolha de outro presidente sem o voto popular. O senador Tasso Jereissati e o deputado Rodrigo Maia despontam como favoritos numa eleição indireta.
Políticos da situação e empresários não aceitam falar em diretas. A aliança que apoiava Michel Temer quer ungir um candidato comprometido com as reformas liberais. A ordem é mudar o presidente sem mudar a alma do governo em decomposição.
Em meio às conversas, articula-se um grande acordo para salvar investigados da Lava Jato. Entre as ideias mais cotadas, estão a anistia ao caixa dois e a concessão de algum tipo de imunidade a Temer, que poderia se estender a outros ex-presidentes.
Pelo roteiro das indiretas, o próximo inquilino do Planalto será escolhido por 513 deputados e 81 senadores. Boa parte deles é investigada sob suspeita de vender projetos de lei, MPs e outras mercadorias menos valiosas que a cadeira presidencial.
Nas últimas vezes que a turma elegeu os chefes da Câmara e do Senado, venceram Eduardo Cunha, Renan Calheiros, Rodrigo Maia e Eunício Oliveira. Todos delatados na Lava Jato.
Além de mostrar o que acontece numa eleição indireta, Juruna ensinou a usar o gravador em conversas com políticos. O cacique era atrapalhado, mas sabia das coisas.
sábado, 27 de maio de 2017
Líder filipino sugere que soldados que cometam estupros fiquem impunes
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2017/05/1888009-lider-filipino-sugere-que-soldados-que-cometam-estupros-fiquem-impunes.shtml
DA REUTERS
27/05/2017 12h27
O presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, demonstrou apoio a soldados que possam ser acusados de cometer abusos sob lei marcial e, em tom jocoso, disse que se algum militar estuprasse três mulheres ele assumiria a responsabilidade sobre o crime.
Conhecido por comentários desbocados, Duterte disse que o comentário foi uma piada e que ele não tolerará abusos. O líder filipino também disse que assumirá a responsabilidade pelas reações contra a lei marcial imposta recentemente na ilha de Minanao, que enfrenta uma insurgência de extremistas ligados ao Estado Islâmico.
"Se vocês afundarem, eu afundo. Mas para esta lei marcial e suas consequências e ramificações, eu serei o único responsável. Apenas façam seu trabalho e eu tomarei conta do resto", disse o líder filipino a soldados na região.
"Eu mesmo prenderei vocês", disse, referindo-se a militares que cometerem abusos. Depois, brincou: "Se você cometer três estupros, eu admito, entrará na minha conta."
Ele também brincou que se juntaria aos soldados na luta contra os extremistas se pudesse, mas que sua artrite o impede de combater.
Não é a primeira vez que Duterte faz piadas sobre estupro. No ano passado, ele lembrou de um episódio de 1989 em que uma missionária australiana foi morta e sofreu estupro coletivo, dizendo que a vítima era bomnita e que por ser prefeito da cidade em que ocorreu o crime deveria ter sido o primeiro na fila dos estupradores. Depois de fazer os comentários, ele teve de se retratar.
Após militantes extremistas conflagrarem a cidade de Marawi, Duterte impôs na quinta-feira (25) uma lei marcial por 60 dias na ilha de Mindanao, no Sul, onde vivem 22 milhões de pessoas. O presidente advertiu que pode expandir a lei marcial em todo o país.
"Minha ordem para os soldados é que, se pessoas que não têm autorização do governo para portar armas oferecerem resistência, matem-nas, varram-nas", afirmou.
DA REUTERS
27/05/2017 12h27
O presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, demonstrou apoio a soldados que possam ser acusados de cometer abusos sob lei marcial e, em tom jocoso, disse que se algum militar estuprasse três mulheres ele assumiria a responsabilidade sobre o crime.
Conhecido por comentários desbocados, Duterte disse que o comentário foi uma piada e que ele não tolerará abusos. O líder filipino também disse que assumirá a responsabilidade pelas reações contra a lei marcial imposta recentemente na ilha de Minanao, que enfrenta uma insurgência de extremistas ligados ao Estado Islâmico.
"Se vocês afundarem, eu afundo. Mas para esta lei marcial e suas consequências e ramificações, eu serei o único responsável. Apenas façam seu trabalho e eu tomarei conta do resto", disse o líder filipino a soldados na região.
"Eu mesmo prenderei vocês", disse, referindo-se a militares que cometerem abusos. Depois, brincou: "Se você cometer três estupros, eu admito, entrará na minha conta."
Ele também brincou que se juntaria aos soldados na luta contra os extremistas se pudesse, mas que sua artrite o impede de combater.
Não é a primeira vez que Duterte faz piadas sobre estupro. No ano passado, ele lembrou de um episódio de 1989 em que uma missionária australiana foi morta e sofreu estupro coletivo, dizendo que a vítima era bomnita e que por ser prefeito da cidade em que ocorreu o crime deveria ter sido o primeiro na fila dos estupradores. Depois de fazer os comentários, ele teve de se retratar.
Após militantes extremistas conflagrarem a cidade de Marawi, Duterte impôs na quinta-feira (25) uma lei marcial por 60 dias na ilha de Mindanao, no Sul, onde vivem 22 milhões de pessoas. O presidente advertiu que pode expandir a lei marcial em todo o país.
"Minha ordem para os soldados é que, se pessoas que não têm autorização do governo para portar armas oferecerem resistência, matem-nas, varram-nas", afirmou.
Nelson Jobim retrata como ninguém uma classe política acuada
Fonte: http://m.folha.uol.com.br/colunas/matiasspektor/2017/05/1887176-nelson-jobim-retrata-como-ninguem-uma-classe-politica-acuada.shtml#
MATIAS SPEKTOR
25/05/2017 02h00
Quando tentava convencer deputados e senadores a abandonarem Dilma Rousseff, Michel Temer prometia usar a força do cargo presidencial para "estancar a sangria", na expressão infame de Romero Jucá. A promessa serviu como ímã para construir a base parlamentar do impeachment e, de quebra, a coalizão pró-reformas estruturais e anti-Operação Lava Jato que viria a seguir.
O esquema funcionou durante um ano, e o presidente articulou-se no Congresso Nacional do jeito que sempre se fez no Brasil. Unida, a coalizão de sustentação testou diversas fórmulas para melar a operação.
Agora, porém, Joesley Batista inviabilizou esse jogo, e o presidente da República vem perdendo a capacidade de entregar o que prometeu à base de parlamentares da qual depende para governar.
Diante do declínio inesperado da força de Temer, vem ganhando tração a ideia de uma improvável coalizão de conveniência entre PT e PSDB. Juntos, Lula e FHC pisariam com os quatro pés no freio de arrumação. Na eventualidade de Temer cair, o recheio dessa pizza suprapartidária seria um nome como o de Nelson Jobim.
Jobim retrata como ninguém a classe política que hoje está acuada. Membro de todos os governos do ciclo democrático, ele não possui lado, navega com destreza por toda parte e acumula força graças aos laços estreitos que construiu com os principais grupos de interesse que movem a política brasileira.
Nos últimos anos, seja como sócio no BTG, seja na articulação de contratos polpudos tais como os do submarino nuclear, dos caças Gripen ou do sistema de controle de fronteiras, Jobim dominou a interação entre Estado, mercado e terceiros países que a Operação Lava Jato trouxe à superfície.
A viabilidade dessa pizza dependerá da capacidade de Lula e FHC conseguirem trabalhar num projeto comum. O petista não tem muita alternativa: os crimes de seu partido são tantos e tão graves, a sigla tão rachada em facções, que a única direção possível é partir para cima da Operação Lava Jato.
O tucano tem outras alternativas. Com a queda dos principais caciques, FHC conseguiria disciplinar sua sigla, reconhecendo os erros, ressarcindo o erário e pedindo desculpas ao eleitor, antes de pedir-lhe o voto. Para FHC, abrir o programa na TV onde Aécio faz um mea-culpa fajuto não é destino.
Se o plano da pizza vingar, o grande perdedor será o povo brasileiro, que quer a punição de uma classe política que só faz decepcionar. Se FHC quiser mesmo proteger o país de "aventureiros", a última coisa que deveria fazer é tentar enfiar massa podre goela abaixo da nação.
MATIAS SPEKTOR
25/05/2017 02h00
Quando tentava convencer deputados e senadores a abandonarem Dilma Rousseff, Michel Temer prometia usar a força do cargo presidencial para "estancar a sangria", na expressão infame de Romero Jucá. A promessa serviu como ímã para construir a base parlamentar do impeachment e, de quebra, a coalizão pró-reformas estruturais e anti-Operação Lava Jato que viria a seguir.
O esquema funcionou durante um ano, e o presidente articulou-se no Congresso Nacional do jeito que sempre se fez no Brasil. Unida, a coalizão de sustentação testou diversas fórmulas para melar a operação.
Agora, porém, Joesley Batista inviabilizou esse jogo, e o presidente da República vem perdendo a capacidade de entregar o que prometeu à base de parlamentares da qual depende para governar.
Diante do declínio inesperado da força de Temer, vem ganhando tração a ideia de uma improvável coalizão de conveniência entre PT e PSDB. Juntos, Lula e FHC pisariam com os quatro pés no freio de arrumação. Na eventualidade de Temer cair, o recheio dessa pizza suprapartidária seria um nome como o de Nelson Jobim.
Jobim retrata como ninguém a classe política que hoje está acuada. Membro de todos os governos do ciclo democrático, ele não possui lado, navega com destreza por toda parte e acumula força graças aos laços estreitos que construiu com os principais grupos de interesse que movem a política brasileira.
Nos últimos anos, seja como sócio no BTG, seja na articulação de contratos polpudos tais como os do submarino nuclear, dos caças Gripen ou do sistema de controle de fronteiras, Jobim dominou a interação entre Estado, mercado e terceiros países que a Operação Lava Jato trouxe à superfície.
A viabilidade dessa pizza dependerá da capacidade de Lula e FHC conseguirem trabalhar num projeto comum. O petista não tem muita alternativa: os crimes de seu partido são tantos e tão graves, a sigla tão rachada em facções, que a única direção possível é partir para cima da Operação Lava Jato.
O tucano tem outras alternativas. Com a queda dos principais caciques, FHC conseguiria disciplinar sua sigla, reconhecendo os erros, ressarcindo o erário e pedindo desculpas ao eleitor, antes de pedir-lhe o voto. Para FHC, abrir o programa na TV onde Aécio faz um mea-culpa fajuto não é destino.
Se o plano da pizza vingar, o grande perdedor será o povo brasileiro, que quer a punição de uma classe política que só faz decepcionar. Se FHC quiser mesmo proteger o país de "aventureiros", a última coisa que deveria fazer é tentar enfiar massa podre goela abaixo da nação.
Policiais festejaram após matarem dez sem-terras, afirma testemunha
Fonte: http://m.folha.uol.com.br/poder/2017/05/1887886-policiais-festejaram-apos-matarem-dez-sem-terras-afirma-testemunha.shtml?mobile#
FABIANO MAISONNAVE
AVENER PRADO
ENVIADOS ESPECIAIS A REDENÇÃO (PA)
27/05/2017 02h00
Em depoimento sigiloso obtido pela Folha, um sobrevivente do massacre que deixou dez mortos no sudeste do Pará, na última quarta (24), disse que os sem-terra já estavam dominados quando foram mortos a tiros por policiais.
Segundo relato ao Ministério Público, os agentes chegaram por volta das 7h ao acampamento, em área invadida da fazenda Santa Lúcia, no município de Pau d'Arco (867 km ao sul de Belém). Em seguida, os 28 sem-terra do grupo se dispersaram correndo.
Parte deles, incluindo a testemunha, teria se escondido em um matagal próximo e, por causa da chuva, se abrigado sob uma lona. Neste momento, a polícia os alcançou e começou a disparar, diz o relato.
Ele novamente correu e se escondeu a cerca de 70 metros de onde estava abrigado. Dali, escutou uma sequência de xingamentos e aparentemente chutes seguidos por disparos. "Logo tudo era repetido com outra pessoa".
Por vezes, ainda de acordo com a versão do sem-terra, um policial perguntava antes de disparar: "Vira pra cá, vagabundo. Cadê os outros?". A ação teria durado cerca de duas horas. Ao final, teria ouvido "gritos e gargalhadas, como se estivessem festejando".
O depoente admitiu que havia armas no acampamento, incluindo o fuzil mais tarde apresentado pela polícia, mas disse que não houve revide.
Ele prestou depoimento sob a condição de anonimato e foi encaminhado ao programa de proteção a testemunhas.
O relato contradiz a versão do governo do Pará, segundo a qual 24 policiais civis e militares foram recebidos a tiros quando chegaram ao local.
Ao menos outros três sobreviventes foram localizados. Um deles levou um tiro na nádega e está internado num hospital da cidade de Redenção. Os Ministérios Públicos Federal e Estadual solicitaram proteção à Polícia Federal, mas o pedido não havia sido respondido até esta sexta (26).
Ele e a sua mulher, que também escapou, já prestaram depoimento à polícia. Procurada, a Secretaria de Segurança Pública paraense disse que o teor do relato está sob sigilo.
O terceiro sobrevivente localizado também testemunhou. A Folha apurou que ele disse não ter visto a ação por ter fugido para longe do local.
A operação policial teria o objetivo de cumprir quatro mandados de prisão relacionados ao assassinato de um segurança da fazenda invadida, no dia 30 de abril.
Em decisão criticada pelo Ministério Público Federal, os corpos foram retirados do local por policiais civis e militares antes da perícia, contaminando a cena do massacre.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública, a alteração do local das mortes está sob apuração da própria Polícia Civil. A Folha solicitou entrevistas com o secretário da pasta, Jeannot Jansen, e o chefe da Delegacia de Conflitos Agrários de Redenção (PA), Valdivino Miranda. Os dois pedidos foram negados.
"O depoimento fortalece as dúvidas sobre a versão da polícia surgidas após a visita ao local", afirma a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, que vistoriou o local na quinta.
Para o presidente do CNDH (Conselho Nacional dos Direitos Humanos), Darci Frigo, que também esteve na região, todas as informações disponíveis até agora indicam que não houve confronto. "A dúvida é: por que se usou tanta violência nessa operação?"
FABIANO MAISONNAVE
AVENER PRADO
ENVIADOS ESPECIAIS A REDENÇÃO (PA)
27/05/2017 02h00
Em depoimento sigiloso obtido pela Folha, um sobrevivente do massacre que deixou dez mortos no sudeste do Pará, na última quarta (24), disse que os sem-terra já estavam dominados quando foram mortos a tiros por policiais.
Segundo relato ao Ministério Público, os agentes chegaram por volta das 7h ao acampamento, em área invadida da fazenda Santa Lúcia, no município de Pau d'Arco (867 km ao sul de Belém). Em seguida, os 28 sem-terra do grupo se dispersaram correndo.
Parte deles, incluindo a testemunha, teria se escondido em um matagal próximo e, por causa da chuva, se abrigado sob uma lona. Neste momento, a polícia os alcançou e começou a disparar, diz o relato.
Ele novamente correu e se escondeu a cerca de 70 metros de onde estava abrigado. Dali, escutou uma sequência de xingamentos e aparentemente chutes seguidos por disparos. "Logo tudo era repetido com outra pessoa".
Por vezes, ainda de acordo com a versão do sem-terra, um policial perguntava antes de disparar: "Vira pra cá, vagabundo. Cadê os outros?". A ação teria durado cerca de duas horas. Ao final, teria ouvido "gritos e gargalhadas, como se estivessem festejando".
O depoente admitiu que havia armas no acampamento, incluindo o fuzil mais tarde apresentado pela polícia, mas disse que não houve revide.
Ele prestou depoimento sob a condição de anonimato e foi encaminhado ao programa de proteção a testemunhas.
O relato contradiz a versão do governo do Pará, segundo a qual 24 policiais civis e militares foram recebidos a tiros quando chegaram ao local.
Ao menos outros três sobreviventes foram localizados. Um deles levou um tiro na nádega e está internado num hospital da cidade de Redenção. Os Ministérios Públicos Federal e Estadual solicitaram proteção à Polícia Federal, mas o pedido não havia sido respondido até esta sexta (26).
Ele e a sua mulher, que também escapou, já prestaram depoimento à polícia. Procurada, a Secretaria de Segurança Pública paraense disse que o teor do relato está sob sigilo.
O terceiro sobrevivente localizado também testemunhou. A Folha apurou que ele disse não ter visto a ação por ter fugido para longe do local.
A operação policial teria o objetivo de cumprir quatro mandados de prisão relacionados ao assassinato de um segurança da fazenda invadida, no dia 30 de abril.
Em decisão criticada pelo Ministério Público Federal, os corpos foram retirados do local por policiais civis e militares antes da perícia, contaminando a cena do massacre.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública, a alteração do local das mortes está sob apuração da própria Polícia Civil. A Folha solicitou entrevistas com o secretário da pasta, Jeannot Jansen, e o chefe da Delegacia de Conflitos Agrários de Redenção (PA), Valdivino Miranda. Os dois pedidos foram negados.
"O depoimento fortalece as dúvidas sobre a versão da polícia surgidas após a visita ao local", afirma a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, que vistoriou o local na quinta.
Para o presidente do CNDH (Conselho Nacional dos Direitos Humanos), Darci Frigo, que também esteve na região, todas as informações disponíveis até agora indicam que não houve confronto. "A dúvida é: por que se usou tanta violência nessa operação?"
Repórter chamada de "idiota" por Bolsonaro em 2014 desistiu de processo: "não tive respaldo"
Fonte: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2017/05/25/foto-de-universitarios-causa-polemica-por-incentivar-cultura-do-estupro.htm
Patrick Mesquita
Colaboração para o UOL 26/05/201716h56
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Um vídeo de abril de 2014, que mostra a discussão do deputado Jair Bolsonaro com uma repórter na Câmara dos Deputados, em Brasília, voltou a viralizar na internet nos últimos dias. Nele, o parlamentar bate-boca com a jornalista Manuela Borges, até então funcionária da RedeTV!. O entrevero teve início quando o político se irritou com uma pergunta sobre a ditadura militar. Manuela, na ocasião, prometeu processar o deputado ao ser chamada de "idiota" e "ignorante". Três anos depois, o caso voltou a ganhar força nas redes sociais, o que não surpreendeu a profissional.
"Viralizou porque é a lei da internet. É para o bem e para o mal. Eu já pedi para amigos que não me marquem em posts, para que não descubram o meu perfil. Mas, quando vejo, muita gente que conheço compartilhou o caso aplaudindo e dizendo que eu os represento. Também teve quem publicou dizendo 'É isso mesmo, Bolsomito'. É assim para os dois lados. Acabou que eu dei audiência para ele, porque ele foi a uns oito programas de televisão", conta Manuela Borges em entrevista ao UOL.
A ação prometida pela repórter, de processar o político, não aconteceu. De acordo com Manuela, não houve qualquer respaldo da RedeTV!, o que colaborou para que ela perdesse a coragem de entrar na Justiça. Os únicos respaldos foram uma nota de repúdio do Sindicato dos Jornalistas de Brasília e um processo movido por outro parlamentar na Câmara pedindo quebra de decoro. A repórter, no entanto, não sabe precisar como está o procedimento.
"Na época eu estava na RedeTV! e ela me desencorajou, me orientou a não processar o parlamentar. Aí o Sindicato dos Jornalistas me deu apoio. Foi uma situação super desagradável. Não me deram respaldo nenhum, não divulgaram nota de repúdio. Eu fiquei bem chateada. Só entraram em contato comigo dois dias depois. O Rafinha Bastos entrou em contato comigo para falar por telefone ao vivo no programa dele. Eles convidaram o Bolsonaro também para falar sobre o assunto. Como o deputado iria participar, eles queriam me entrevistar ao vivo. Pedi para a RedeTV!, e não me deram resposta", lembra.
Amigo ajudou na decisão
Além da falta de respaldo da RedeTV!, Manuela afirma que conversar com um amigo foi decisivo para que ela não fosse adiante com a ideia de processo.
"Também teve uma conversa com um amigo. Ele disse: 'você está preparada para ir para a Justiça? Vai que esses juízes te culpam e dão multa? Se eu fosse você, não mexia com isso'. Conversei bastante com o Sindicato de Brasília. Me deram suporte, mas não compraram a briga. O jurídico deles não tinha condições. Encontraram uma resposta jurídica para não me representar", alega.
A situação não foi fácil de ser superada. Manuela Borges revela que chegou a ser hostilizada por seguidores do deputado na época e que ficou com medo de atitudes mais graves.
"Eu já fui gravemente hostilizada por seguidores do Bolsonaro. No ano passado, estava fazendo reportagem sobre paraolimpíadas. Uma atleta furou na entrevista. Eu publiquei na página dela e deixei meu telefone para contato para saber se ela daria a entrevista. Ela não respondeu. Um cara, que deveria ser conhecido dela, me xingou de todos os nomes. Tenho medo deles, são pessoas perigosas. Nunca conversaram comigo para justificar. Fui ameaçada e decidi ficar quieta", lembra.
Manuela deixou a RedeTV! pouco tempo depois. Hoje, em outro emprego e mãe, ela afirma que evita o tema por "preguiça" e por estar em outro momento da vida, mas reafirma a posição de que Bolsonaro errou no episódio.
Procurada pelo UOL, a emissora ainda não se pronunciou até a publicação desta reportagem.
Patrick Mesquita
Colaboração para o UOL 26/05/201716h56
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Um vídeo de abril de 2014, que mostra a discussão do deputado Jair Bolsonaro com uma repórter na Câmara dos Deputados, em Brasília, voltou a viralizar na internet nos últimos dias. Nele, o parlamentar bate-boca com a jornalista Manuela Borges, até então funcionária da RedeTV!. O entrevero teve início quando o político se irritou com uma pergunta sobre a ditadura militar. Manuela, na ocasião, prometeu processar o deputado ao ser chamada de "idiota" e "ignorante". Três anos depois, o caso voltou a ganhar força nas redes sociais, o que não surpreendeu a profissional.
"Viralizou porque é a lei da internet. É para o bem e para o mal. Eu já pedi para amigos que não me marquem em posts, para que não descubram o meu perfil. Mas, quando vejo, muita gente que conheço compartilhou o caso aplaudindo e dizendo que eu os represento. Também teve quem publicou dizendo 'É isso mesmo, Bolsomito'. É assim para os dois lados. Acabou que eu dei audiência para ele, porque ele foi a uns oito programas de televisão", conta Manuela Borges em entrevista ao UOL.
A ação prometida pela repórter, de processar o político, não aconteceu. De acordo com Manuela, não houve qualquer respaldo da RedeTV!, o que colaborou para que ela perdesse a coragem de entrar na Justiça. Os únicos respaldos foram uma nota de repúdio do Sindicato dos Jornalistas de Brasília e um processo movido por outro parlamentar na Câmara pedindo quebra de decoro. A repórter, no entanto, não sabe precisar como está o procedimento.
"Na época eu estava na RedeTV! e ela me desencorajou, me orientou a não processar o parlamentar. Aí o Sindicato dos Jornalistas me deu apoio. Foi uma situação super desagradável. Não me deram respaldo nenhum, não divulgaram nota de repúdio. Eu fiquei bem chateada. Só entraram em contato comigo dois dias depois. O Rafinha Bastos entrou em contato comigo para falar por telefone ao vivo no programa dele. Eles convidaram o Bolsonaro também para falar sobre o assunto. Como o deputado iria participar, eles queriam me entrevistar ao vivo. Pedi para a RedeTV!, e não me deram resposta", lembra.
Amigo ajudou na decisão
Além da falta de respaldo da RedeTV!, Manuela afirma que conversar com um amigo foi decisivo para que ela não fosse adiante com a ideia de processo.
"Também teve uma conversa com um amigo. Ele disse: 'você está preparada para ir para a Justiça? Vai que esses juízes te culpam e dão multa? Se eu fosse você, não mexia com isso'. Conversei bastante com o Sindicato de Brasília. Me deram suporte, mas não compraram a briga. O jurídico deles não tinha condições. Encontraram uma resposta jurídica para não me representar", alega.
A situação não foi fácil de ser superada. Manuela Borges revela que chegou a ser hostilizada por seguidores do deputado na época e que ficou com medo de atitudes mais graves.
"Eu já fui gravemente hostilizada por seguidores do Bolsonaro. No ano passado, estava fazendo reportagem sobre paraolimpíadas. Uma atleta furou na entrevista. Eu publiquei na página dela e deixei meu telefone para contato para saber se ela daria a entrevista. Ela não respondeu. Um cara, que deveria ser conhecido dela, me xingou de todos os nomes. Tenho medo deles, são pessoas perigosas. Nunca conversaram comigo para justificar. Fui ameaçada e decidi ficar quieta", lembra.
Manuela deixou a RedeTV! pouco tempo depois. Hoje, em outro emprego e mãe, ela afirma que evita o tema por "preguiça" e por estar em outro momento da vida, mas reafirma a posição de que Bolsonaro errou no episódio.
Procurada pelo UOL, a emissora ainda não se pronunciou até a publicação desta reportagem.
Virada Cultural foi cinza, e ausência do prefeito é sintomática
Fonte: http://m.folha.uol.com.br/ilustrada/2017/05/1886200-virada-cultural-foi-cinza-e-ausencia-do-prefeito-e-sintomatica.shtml#
FRANCESCA ANGIOLILLO
EDITORA-ADJUNTA DE CULTURA
22/05/2017 02h00
A primeira Virada Cultural aconteceu em 2005, sob a gestão de José Serra (PSDB). O modelo, todos sabemos, era a Nuit Blanche (noite branca, ou noite em claro) parisiense, e a proposta era oferecer à população 24 horas de programação cultural gratuita.
Serra abriu o evento às 14h do sábado, 19 de novembro, no museu do Ipiranga, antes de apresentação da Orquestra Experimental de Repertório, regida por Jamil Maluf.
Houve, em 2005, shows, como os de Tom Zé, Elza Soares e Adriana Calcanhotto; mas houve também passeio noturno promovido pela Pinacoteca no Jardim da Luz.
De lá para cá, houve museus abertos de madrugada, iluminação especial para monumentos, músicos pendurados sobre a avenida Paulista.
Houve também incidentes graves, como a pancadaria diante do palco dos Racionais em 2007; arrastões (ao menos 18, em 2014); esfaqueamentos; tiros; mortos e feridos.
A questão da segurança, tão cara aos paulistanos, brotou cedo no discurso da nova gestão tucana. Antes mesmo da posse de João Doria, ainda em dezembro, veio a primeira notícia: a Virada iria para Interlagos, transformando-se numa espécie de "confinada cultural", a antítese de seu espírito, de promover a circulação do público pela cidade.
Depois a ideia se nuançou; o centro não teria palcos, e sim tablados, estruturas menores, para evitar multidões e fazer a Virada mais segura.
É verdade que essa cidade pela qual se circulava a pé durante 24h uma vez ao ano era quase apenas o centro. São Paulo não é Paris, bem menor e sem os problemas de mobilidade da capital paulista.
Mas, se nem todos se animavam ou tinham recursos para chegar aos grandes palcos na Júlio Prestes ou na São João, havia programação nas unidades do Sesc e nos CEUs.
Com o centro esvaziado, a Virada neste ano foi triste. A chuva contribuiu para o ar cinzento que paira sobre a cidade, mas, mais que a água, o que empurrou o público para longe do evento foi um bem urdido plano de dispersão.
Que o prefeito João Doria não tenha feito nenhuma aparição oficial durante o maior evento cultural de sua cidade, organizado por sua gestão, preferindo desfilar pela cracolândia após a ação policial do governo do Estado neste domingo, é sintomático.
Ali, perto de onde tantas vezes ocorreram apresentações musicais, de dança, de teatro, ele proclamou que a cracolândia tinha acabado. Resta saber se a Virada também.
FRANCESCA ANGIOLILLO
EDITORA-ADJUNTA DE CULTURA
22/05/2017 02h00
A primeira Virada Cultural aconteceu em 2005, sob a gestão de José Serra (PSDB). O modelo, todos sabemos, era a Nuit Blanche (noite branca, ou noite em claro) parisiense, e a proposta era oferecer à população 24 horas de programação cultural gratuita.
Serra abriu o evento às 14h do sábado, 19 de novembro, no museu do Ipiranga, antes de apresentação da Orquestra Experimental de Repertório, regida por Jamil Maluf.
Houve, em 2005, shows, como os de Tom Zé, Elza Soares e Adriana Calcanhotto; mas houve também passeio noturno promovido pela Pinacoteca no Jardim da Luz.
De lá para cá, houve museus abertos de madrugada, iluminação especial para monumentos, músicos pendurados sobre a avenida Paulista.
Houve também incidentes graves, como a pancadaria diante do palco dos Racionais em 2007; arrastões (ao menos 18, em 2014); esfaqueamentos; tiros; mortos e feridos.
A questão da segurança, tão cara aos paulistanos, brotou cedo no discurso da nova gestão tucana. Antes mesmo da posse de João Doria, ainda em dezembro, veio a primeira notícia: a Virada iria para Interlagos, transformando-se numa espécie de "confinada cultural", a antítese de seu espírito, de promover a circulação do público pela cidade.
Depois a ideia se nuançou; o centro não teria palcos, e sim tablados, estruturas menores, para evitar multidões e fazer a Virada mais segura.
É verdade que essa cidade pela qual se circulava a pé durante 24h uma vez ao ano era quase apenas o centro. São Paulo não é Paris, bem menor e sem os problemas de mobilidade da capital paulista.
Mas, se nem todos se animavam ou tinham recursos para chegar aos grandes palcos na Júlio Prestes ou na São João, havia programação nas unidades do Sesc e nos CEUs.
Com o centro esvaziado, a Virada neste ano foi triste. A chuva contribuiu para o ar cinzento que paira sobre a cidade, mas, mais que a água, o que empurrou o público para longe do evento foi um bem urdido plano de dispersão.
Que o prefeito João Doria não tenha feito nenhuma aparição oficial durante o maior evento cultural de sua cidade, organizado por sua gestão, preferindo desfilar pela cracolândia após a ação policial do governo do Estado neste domingo, é sintomático.
Ali, perto de onde tantas vezes ocorreram apresentações musicais, de dança, de teatro, ele proclamou que a cracolândia tinha acabado. Resta saber se a Virada também.
Universidade Mackenzie de SP abre centro que questiona a evolução
Fonte: http://m.folha.uol.com.br/ciencia/2017/05/1882590-universidade-mackenzie-de-sp-abre-centro-que-questiona-a-evolucao.shtml?cmpid=compfb#
REINALDO JOSÉ LOPES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
10/05/2017 02h00
A Universidade Presbiteriana Mackenzie, uma das mais tradicionais de São Paulo, acaba de inaugurar um núcleo de ciência, fé e sociedade que tem como um de seus objetivos a realização de pesquisas sobre a chamada teoria do DI (Design Inteligente).
Os defensores do DI, cujas ideias são rejeitadas pela maioria da comunidade científica, argumentam que os seres vivos são tão complexos que ao menos parte de suas estruturas só poderia ter sido projetada deliberadamente por algum tipo de inteligência.
O novo centro recebeu o nome de Núcleo Discovery-Mackenzie por causa da parceria entre a universidade brasileira e o Discovery Institute, nos EUA.
A instituição americana está entre os principais promotores da causa do DI e já sofreu derrotas judiciais em seu país por defender que a ideia fosse ensinada em escolas públicas em paralelo com a teoria da evolução, hoje a explicação mais consolidada sobre a diversidade da vida.
Tribunais dos EUA consideraram que o DI seria, na essência, muito semelhante ao criacionismo bíblico (a ideia de que Deus criou diretamente o homem e os demais seres vivos) e, portanto, seu ensino violaria a separação legal entre religião e Estado no país.
"É importante destacar que não é um núcleo de DI, e sim um núcleo de fé, ciência e sociedade", declarou à Folha o teólogo e pastor presbiteriano Davi Charles Gomes, chanceler da universidade. "Nossa instituição é confessional, o que significa que ela tem uma visão segundo a qual o mundo tem um significado transcendente. E não existe ciência que, no fundo, não reflita também sobre coisas transcendentes."
DE BACTÉRIAS AO TRÂNSITO
Segundo Gomes, o contato com o Discovery Institute já acontece desde a década passada, quando a universidade começou a organizar o ciclo de simpósios Darwinismo Hoje, trazendo biólogos defensores da teoria da evolução e palestrantes que questionam o consenso científico.
"Visitei o Discovery em Seattle e descobri que eles aplicam a ideia de design inteligente e complexidade irredutível a uma série de questões que vão além dos seres vivos, como sistemas de trânsito."
"Complexidade irredutível" é uma das palavras de ordem dos defensores do DI. O termo costuma ser aplicado a estruturas biológicas que, em geral, têm escala celular ou molecular e apresentariam organização tão intrincada que não poderiam ter surgido de forma gradual e não guiada, contrariando, portanto, o que diz a teoria da evolução.
O grande exemplo seria o flagelo (grosso modo, "cauda") de certas bactérias. Embora biólogos já tenham apresentado indícios fortes de que o flagelo bacteriano poderia ter sido construído a partir de peças de "seringas moleculares" usadas pelos micróbios para injetar toxinas, os adeptos do DI resistem à ideia.
"Quanto mais a gente estuda o flagelo, mais complexo ele fica", argumenta o químico Marcos Eberlin, pesquisador da Unicamp que coordenará o núcleo e é presidente executivo da Sociedade Brasileira do Design Inteligente.
Eberlin afirma que seu objetivo é promover a "avaliação crítica das duas possibilidades" (teoria da evolução e DI), um debate que, segundo ele, estaria sendo barrado pela maior parte da comunidade científica. "O problema é que a academia fechou a questão e não abre brecha para nenhum debate: só existe matéria, energia e espaço no Universo e acabou. Não é assim, os debates é que tornam a ciência divertida", diz.
Grande parte dos defensores do DI são cristãos conservadores, interessados em mostrar uma possível consonância entre os dados biológicos e o relato bíblico da Criação, mas Eberlin afirma que o movimento não impõe uma linha religiosa ou filosófica única. "Tem gente que acha que o design vem dos ETs, outros falam de um Grande Arquiteto do Universo, como os maçons, ou um espírito evoluído, como os espíritas."
PREOCUPANTE
Para especialistas, o projeto tem sabor de fracasso. "É triste e extremamente preocupante", diz o paleontólogo Mario Alberto Cozzuol, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). "As premissas do DI foram derrubadas e expostas já faz muito tempo. Seus proponentes não têm aportado nenhuma novidade para a discussão. O único motivo pelo qual isso continua atraindo gente é a falta de educação em ciências."
"Sabendo que o Mackenzie tem um curso de biologia que não compartilha, ou não compartilhava, das ideias do DI, pode haver choque de interesses. De qualquer forma, o peso simbólico é grande", afirma o teólogo Eduardo Rodrigues da Cruz, especialista na relação entre ciência e religião da PUC-SP.
"Considero que se trata de uma tremenda desonestidade intelectual", diz Maria Cátira Bortolini, geneticista da UFRGS. "As evidências, fatos, provas pouco importam –o que importa é a narrativa, construída de forma que se coadune com a ideologia ou a crença do sujeito."
REINALDO JOSÉ LOPES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
10/05/2017 02h00
A Universidade Presbiteriana Mackenzie, uma das mais tradicionais de São Paulo, acaba de inaugurar um núcleo de ciência, fé e sociedade que tem como um de seus objetivos a realização de pesquisas sobre a chamada teoria do DI (Design Inteligente).
Os defensores do DI, cujas ideias são rejeitadas pela maioria da comunidade científica, argumentam que os seres vivos são tão complexos que ao menos parte de suas estruturas só poderia ter sido projetada deliberadamente por algum tipo de inteligência.
O novo centro recebeu o nome de Núcleo Discovery-Mackenzie por causa da parceria entre a universidade brasileira e o Discovery Institute, nos EUA.
A instituição americana está entre os principais promotores da causa do DI e já sofreu derrotas judiciais em seu país por defender que a ideia fosse ensinada em escolas públicas em paralelo com a teoria da evolução, hoje a explicação mais consolidada sobre a diversidade da vida.
Tribunais dos EUA consideraram que o DI seria, na essência, muito semelhante ao criacionismo bíblico (a ideia de que Deus criou diretamente o homem e os demais seres vivos) e, portanto, seu ensino violaria a separação legal entre religião e Estado no país.
"É importante destacar que não é um núcleo de DI, e sim um núcleo de fé, ciência e sociedade", declarou à Folha o teólogo e pastor presbiteriano Davi Charles Gomes, chanceler da universidade. "Nossa instituição é confessional, o que significa que ela tem uma visão segundo a qual o mundo tem um significado transcendente. E não existe ciência que, no fundo, não reflita também sobre coisas transcendentes."
DE BACTÉRIAS AO TRÂNSITO
Segundo Gomes, o contato com o Discovery Institute já acontece desde a década passada, quando a universidade começou a organizar o ciclo de simpósios Darwinismo Hoje, trazendo biólogos defensores da teoria da evolução e palestrantes que questionam o consenso científico.
"Visitei o Discovery em Seattle e descobri que eles aplicam a ideia de design inteligente e complexidade irredutível a uma série de questões que vão além dos seres vivos, como sistemas de trânsito."
"Complexidade irredutível" é uma das palavras de ordem dos defensores do DI. O termo costuma ser aplicado a estruturas biológicas que, em geral, têm escala celular ou molecular e apresentariam organização tão intrincada que não poderiam ter surgido de forma gradual e não guiada, contrariando, portanto, o que diz a teoria da evolução.
O grande exemplo seria o flagelo (grosso modo, "cauda") de certas bactérias. Embora biólogos já tenham apresentado indícios fortes de que o flagelo bacteriano poderia ter sido construído a partir de peças de "seringas moleculares" usadas pelos micróbios para injetar toxinas, os adeptos do DI resistem à ideia.
"Quanto mais a gente estuda o flagelo, mais complexo ele fica", argumenta o químico Marcos Eberlin, pesquisador da Unicamp que coordenará o núcleo e é presidente executivo da Sociedade Brasileira do Design Inteligente.
Eberlin afirma que seu objetivo é promover a "avaliação crítica das duas possibilidades" (teoria da evolução e DI), um debate que, segundo ele, estaria sendo barrado pela maior parte da comunidade científica. "O problema é que a academia fechou a questão e não abre brecha para nenhum debate: só existe matéria, energia e espaço no Universo e acabou. Não é assim, os debates é que tornam a ciência divertida", diz.
Grande parte dos defensores do DI são cristãos conservadores, interessados em mostrar uma possível consonância entre os dados biológicos e o relato bíblico da Criação, mas Eberlin afirma que o movimento não impõe uma linha religiosa ou filosófica única. "Tem gente que acha que o design vem dos ETs, outros falam de um Grande Arquiteto do Universo, como os maçons, ou um espírito evoluído, como os espíritas."
PREOCUPANTE
Para especialistas, o projeto tem sabor de fracasso. "É triste e extremamente preocupante", diz o paleontólogo Mario Alberto Cozzuol, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). "As premissas do DI foram derrubadas e expostas já faz muito tempo. Seus proponentes não têm aportado nenhuma novidade para a discussão. O único motivo pelo qual isso continua atraindo gente é a falta de educação em ciências."
"Sabendo que o Mackenzie tem um curso de biologia que não compartilha, ou não compartilhava, das ideias do DI, pode haver choque de interesses. De qualquer forma, o peso simbólico é grande", afirma o teólogo Eduardo Rodrigues da Cruz, especialista na relação entre ciência e religião da PUC-SP.
"Considero que se trata de uma tremenda desonestidade intelectual", diz Maria Cátira Bortolini, geneticista da UFRGS. "As evidências, fatos, provas pouco importam –o que importa é a narrativa, construída de forma que se coadune com a ideologia ou a crença do sujeito."
Voto em Le Pen reflete angústia de França periférica, afirma geógrafo
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2017/05/1880601-voto-em-le-pen-reflete-angustia-de-franca-periferica-afirma-geografo.shtml
DIOGO BERCITO
ENVIADO ESPECIAL A PARIS
03/05/2017 02h00
A França está dividida, segundo o geógrafo Christophe Guilluy, 52. Não em norte e sul, leste ou oeste. A fronteira real, ele diz, ziguezagueia pelo mapa separando o país em metrópoles e periferias.
Sua tese, publicada em 2014 no livro "França Periférica", virou uma referência após o primeiro turno das eleições, em 23 de abril, que evidenciou a fratura exposta.
O candidato centrista Emmanuel Macron venceu na metrópole. Marine Le Pen, de extrema direita, triunfou na periferia —nome que esse geógrafo dá, por exemplo, às pequenas cidades que ressentem o desemprego e a menor atenção do Estado.
Em Paris, Macron teve 35% dos votos enquanto Le Pen recebeu 5%. Em Hénin-Beaumont, no norte, com 26 mil habitantes, o resultado foi outro: 15% do centrista contra os 46% da direitista.
Neste domingo (7), o segundo turno será disputado por essas duas diferentes Franças, segundo Guilluy. Centro e periferia, alto e baixo, visível e invisível.
*
Folha - Quando o sr. viu o mapa dos resultados do primeiro turno, qual foi sua reação?
Christophe Guilluy - As verdadeiras diferenças sociais, culturais e geográficas apareceram. A disputa entre Macron e Le Pen permite que esqueçamos a divisão entre esquerda e direita para revelar as fraturas francesas.
Há uma divisão entre leste e oeste no mapa, Le Pen e Macron. Mas o sr. argumenta que o mais importante é a divisão entre centro e periferia.
A divisão entre leste e oeste é histórica. É a geografia social herdada da era industrial, que opunha a França do leste, industrializada e urbana, à França do oeste, rural.
Mas essa geografia não revela mais as dinâmicas em curso que opõem as metrópoles globalizadas à França periférica, das cidades pequenas e das zonas rurais.
Qualquer que seja a região, o voto em Le Pen é o negativo do voto em Macron. Macron é superrepresentado nas grandes cidades. Já o voto em Le Pen ocorre nos territórios da França periférica.
Como essa geografia específica se desenvolveu?
Ela está ligada à adaptação da sociedade francesa e de seus territórios. Na França, como nos Estados Unidos e no Reino Unido, as riquezas e a produção estão concentradas nas metrópoles. Esse modelo criou em todo o mundo uma contestação populista, que emana das categorias que constituíam antes o cerne da classe média: operários, assalariados, camponeses. Essas categorias foram as grandes perdedoras no processo de adaptação de suas economias [locais] à economia mundial.
Qual é o impacto da globalização no voto?
A globalização se baseia na divisão internacional do trabalho, que condena a classe média ocidental. Vivemos há 30 anos em um processo de evasão da classe média, que tem se distanciado das zonas onde há criação de emprego.
A emergência de uma classe média chinesa ou indiana ocorre em detrimento dos operários ou assalariados franceses, americanos e britânicos.
Nesse sentido, o que um candidato como Emmanuel Macron pode oferecer para persuadir quem se sente prejudicado pela globalização?
Isso será difícil porque ele sempre será prisioneiro de sua própria sociologia: aquela dos vencedores e dos protegidos da globalização.
O sr. critica o que chama de atitude de "superioridade moral" de quem é contrário ao fascismo.
O antifascismo se tornou uma arma de classe. Uma arma de proteção da nova burguesia. Ele permite desqualificar o diagnóstico das categorias populares e envolvê-los em um suposto racismo.
Essa atitude de superioridade moral permite que, há 20 anos, a análise dos efeitos da globalização nas classes mais baixas seja esvaziada.
Dizer que os oponentes são racistas impede o debate político, portanto?
A emergência de uma sociedade multicultural é outro motor do voto populista.
A sociedade multicultural é uma sociedade do "outro". A ansiedade em torno da migração está ligada à angústia de se tornar uma minoria.
A instabilidade demográfica gera, assim, uma insegurança cultural que é ressentida em especial por aqueles que não têm uma barreira visível entre eles e os "outros".
As classes altas têm a possibilidade de erguer fronteiras invisíveis. Eles podem escolher o local onde vão morar ou a escola onde seus filhos vão estudar. Podem, portanto, carregar o discurso da sociedade aberta enquanto se protegem do "outro".
Inversamente, os mais modestos, que não possuem os meios da fronteira invisível, pedem um Estado forte para protegê-los, para manter as fronteiras. Eles são mais receptivos ao discurso populista do que os outros.
DIOGO BERCITO
ENVIADO ESPECIAL A PARIS
03/05/2017 02h00
A França está dividida, segundo o geógrafo Christophe Guilluy, 52. Não em norte e sul, leste ou oeste. A fronteira real, ele diz, ziguezagueia pelo mapa separando o país em metrópoles e periferias.
Sua tese, publicada em 2014 no livro "França Periférica", virou uma referência após o primeiro turno das eleições, em 23 de abril, que evidenciou a fratura exposta.
O candidato centrista Emmanuel Macron venceu na metrópole. Marine Le Pen, de extrema direita, triunfou na periferia —nome que esse geógrafo dá, por exemplo, às pequenas cidades que ressentem o desemprego e a menor atenção do Estado.
Em Paris, Macron teve 35% dos votos enquanto Le Pen recebeu 5%. Em Hénin-Beaumont, no norte, com 26 mil habitantes, o resultado foi outro: 15% do centrista contra os 46% da direitista.
Neste domingo (7), o segundo turno será disputado por essas duas diferentes Franças, segundo Guilluy. Centro e periferia, alto e baixo, visível e invisível.
*
Folha - Quando o sr. viu o mapa dos resultados do primeiro turno, qual foi sua reação?
Christophe Guilluy - As verdadeiras diferenças sociais, culturais e geográficas apareceram. A disputa entre Macron e Le Pen permite que esqueçamos a divisão entre esquerda e direita para revelar as fraturas francesas.
Há uma divisão entre leste e oeste no mapa, Le Pen e Macron. Mas o sr. argumenta que o mais importante é a divisão entre centro e periferia.
A divisão entre leste e oeste é histórica. É a geografia social herdada da era industrial, que opunha a França do leste, industrializada e urbana, à França do oeste, rural.
Mas essa geografia não revela mais as dinâmicas em curso que opõem as metrópoles globalizadas à França periférica, das cidades pequenas e das zonas rurais.
Qualquer que seja a região, o voto em Le Pen é o negativo do voto em Macron. Macron é superrepresentado nas grandes cidades. Já o voto em Le Pen ocorre nos territórios da França periférica.
Como essa geografia específica se desenvolveu?
Ela está ligada à adaptação da sociedade francesa e de seus territórios. Na França, como nos Estados Unidos e no Reino Unido, as riquezas e a produção estão concentradas nas metrópoles. Esse modelo criou em todo o mundo uma contestação populista, que emana das categorias que constituíam antes o cerne da classe média: operários, assalariados, camponeses. Essas categorias foram as grandes perdedoras no processo de adaptação de suas economias [locais] à economia mundial.
Qual é o impacto da globalização no voto?
A globalização se baseia na divisão internacional do trabalho, que condena a classe média ocidental. Vivemos há 30 anos em um processo de evasão da classe média, que tem se distanciado das zonas onde há criação de emprego.
A emergência de uma classe média chinesa ou indiana ocorre em detrimento dos operários ou assalariados franceses, americanos e britânicos.
Nesse sentido, o que um candidato como Emmanuel Macron pode oferecer para persuadir quem se sente prejudicado pela globalização?
Isso será difícil porque ele sempre será prisioneiro de sua própria sociologia: aquela dos vencedores e dos protegidos da globalização.
O sr. critica o que chama de atitude de "superioridade moral" de quem é contrário ao fascismo.
O antifascismo se tornou uma arma de classe. Uma arma de proteção da nova burguesia. Ele permite desqualificar o diagnóstico das categorias populares e envolvê-los em um suposto racismo.
Essa atitude de superioridade moral permite que, há 20 anos, a análise dos efeitos da globalização nas classes mais baixas seja esvaziada.
Dizer que os oponentes são racistas impede o debate político, portanto?
A emergência de uma sociedade multicultural é outro motor do voto populista.
A sociedade multicultural é uma sociedade do "outro". A ansiedade em torno da migração está ligada à angústia de se tornar uma minoria.
A instabilidade demográfica gera, assim, uma insegurança cultural que é ressentida em especial por aqueles que não têm uma barreira visível entre eles e os "outros".
As classes altas têm a possibilidade de erguer fronteiras invisíveis. Eles podem escolher o local onde vão morar ou a escola onde seus filhos vão estudar. Podem, portanto, carregar o discurso da sociedade aberta enquanto se protegem do "outro".
Inversamente, os mais modestos, que não possuem os meios da fronteira invisível, pedem um Estado forte para protegê-los, para manter as fronteiras. Eles são mais receptivos ao discurso populista do que os outros.
Intelectuais e artistas lançam manifesto contra 'desmonte do país'
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/04/1875314-intelectuais-e-artistas-lancam-manifesto-contra-desmonte-do-pais.shtml
DE SÃO PAULO
13/04/2017 15h35
Economistas, professores, sociólogos e artistas lançaram o manifesto "Projeto Brasil Nação". A iniciativa é liderada pelo ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira e conta com as assinaturas de Celso Amorim, Chico Buarque de Hollanda, Fábio Konder Comparato, André Singer, colunista da Folha, entre outros.
O texto critica o "esquartejamento da Petrobras, a destruição da indústria, a demolição de direitos sociais" e afirma que "o governo reacionário e carente de legitimidade não tem um projeto para o Brasil".
O documento defende que sejam adotados cinco pontos econômicos. A primeira é uma regra fiscal que permita a atuação contracíclica do gasto público, ou seja, uma diminuição do superavit para estimular a economia em momentos de crise, política contrária à redução de gastos proposta pelo presidente Michel Temer.
O projeto também defende que a taxa básica de juros seja diminuída até se tornar compatível com o nível praticado por economia similares à do Brasil, um superavit na conta-corrente do balanço de pagamentos, a retomada do investimento público e uma reforma tributária que torne os impostos progressivos.
Leia abaixo o documento na íntegra:
http://www.redebrasilatual.com.br/politica/2017/04/intelectuais-lancam-manifesto-do-projeto-brasil-nacao-1
DE SÃO PAULO
13/04/2017 15h35
Economistas, professores, sociólogos e artistas lançaram o manifesto "Projeto Brasil Nação". A iniciativa é liderada pelo ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira e conta com as assinaturas de Celso Amorim, Chico Buarque de Hollanda, Fábio Konder Comparato, André Singer, colunista da Folha, entre outros.
O texto critica o "esquartejamento da Petrobras, a destruição da indústria, a demolição de direitos sociais" e afirma que "o governo reacionário e carente de legitimidade não tem um projeto para o Brasil".
O documento defende que sejam adotados cinco pontos econômicos. A primeira é uma regra fiscal que permita a atuação contracíclica do gasto público, ou seja, uma diminuição do superavit para estimular a economia em momentos de crise, política contrária à redução de gastos proposta pelo presidente Michel Temer.
O projeto também defende que a taxa básica de juros seja diminuída até se tornar compatível com o nível praticado por economia similares à do Brasil, um superavit na conta-corrente do balanço de pagamentos, a retomada do investimento público e uma reforma tributária que torne os impostos progressivos.
Leia abaixo o documento na íntegra:
http://www.redebrasilatual.com.br/politica/2017/04/intelectuais-lancam-manifesto-do-projeto-brasil-nacao-1
'Toma lá, dá cá' pela Previdência tem impacto fiscal negativo
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/julianna-sofia/2017/05/1883750-toma-la-da-ca-pela-previdencia-tem-impacto-fiscal-negativo.shtml
13/05/2017 02h00
Por Julianna Sofia
BRASÍLIA - A explicitude do "toma lá, dá cá" pela aprovação da reforma da Previdência escala níveis indecorosos. Talvez maior virtude do presidente Michel Temer, a capacidade de diálogo com o Congresso vem sendo drenada pela decrescente popularidade do peemedebista e pela crescente rejeição às mudanças estruturais. Tornaram-se frequentes os achaques multilaterais na Esplanada dos Ministérios.
O Palácio do Planalto cassou à luz do dia cargos federais de deputados aliados que votaram contra a reforma trabalhista. Quem não apoia a agenda governista não pode ter boquinha no governo. Aos fiéis, a ordem é acelerar o pagamento de emendas parlamentares estimadas em R$ 1,9 bilhão. Cogita-se ainda elevar o valor liberado por cabeça.
Sem rodeios, a Frente Parlamentar da Agropecuária avisou à equipe econômica que os mais de 200 agroparlamentares ficarão mais propensos a votar pela nova Previdência se o governo baixar uma medida provisória reduzindo a contribuição ao Funrural (Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural). Quer ainda condições camaradas para pagar um passivo de R$ 10 bilhões com o fundo.
Prefeitos acenam com o apoio de suas bancadas em troca de outra medida provisória. O "quid pro quo" envolve a ampliação de cinco para 20 anos do prazo de parcelamento da dívida dos municípios com o INSS. Temer deve ceder à garfada.
Sob o zelo de deputados sonegadores, a comissão do Congresso que tratava do "novo Refis" incluiu no programa uma miríade de benefícios para devedores da União. Com isso, em vez de arrecadar R$ 8 bilhões, a Receita perderá R$ 23 bilhões. O Ministério da Fazenda, agora, busca frear a investida.
Parlamentares sussurram que um veto às alterações terá efeito indesejado sobre os votos de ao menos 54 deputados.
As negociações pela reforma da Previdência avançam —sem recato e com impacto negativo sobre as contas públicas pouco mensurado.
13/05/2017 02h00
Por Julianna Sofia
BRASÍLIA - A explicitude do "toma lá, dá cá" pela aprovação da reforma da Previdência escala níveis indecorosos. Talvez maior virtude do presidente Michel Temer, a capacidade de diálogo com o Congresso vem sendo drenada pela decrescente popularidade do peemedebista e pela crescente rejeição às mudanças estruturais. Tornaram-se frequentes os achaques multilaterais na Esplanada dos Ministérios.
O Palácio do Planalto cassou à luz do dia cargos federais de deputados aliados que votaram contra a reforma trabalhista. Quem não apoia a agenda governista não pode ter boquinha no governo. Aos fiéis, a ordem é acelerar o pagamento de emendas parlamentares estimadas em R$ 1,9 bilhão. Cogita-se ainda elevar o valor liberado por cabeça.
Sem rodeios, a Frente Parlamentar da Agropecuária avisou à equipe econômica que os mais de 200 agroparlamentares ficarão mais propensos a votar pela nova Previdência se o governo baixar uma medida provisória reduzindo a contribuição ao Funrural (Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural). Quer ainda condições camaradas para pagar um passivo de R$ 10 bilhões com o fundo.
Prefeitos acenam com o apoio de suas bancadas em troca de outra medida provisória. O "quid pro quo" envolve a ampliação de cinco para 20 anos do prazo de parcelamento da dívida dos municípios com o INSS. Temer deve ceder à garfada.
Sob o zelo de deputados sonegadores, a comissão do Congresso que tratava do "novo Refis" incluiu no programa uma miríade de benefícios para devedores da União. Com isso, em vez de arrecadar R$ 8 bilhões, a Receita perderá R$ 23 bilhões. O Ministério da Fazenda, agora, busca frear a investida.
Parlamentares sussurram que um veto às alterações terá efeito indesejado sobre os votos de ao menos 54 deputados.
As negociações pela reforma da Previdência avançam —sem recato e com impacto negativo sobre as contas públicas pouco mensurado.
Doria adota métodos antiquados de gestão
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/nabil-bonduki/2017/05/1884311-doria-adota-metodos-antiquados-de-gestao.shtml
16/05/2017 02h00
Por Nabil Bonduki
Recentemente, Doria foi convidado a abrir o seminário Cidades do Futuro, promovido por uma rádio paulistana. Esperava-se que ele apontasse os desafios que as grandes cidades devem enfrentar no século 21 (mudanças climáticas, desigualdade, novos modos de vida, violência, mobilidade) e a estratégia proposta para São Paulo.
Para surpresa do público, o prefeito proferiu mais um discurso ideológico e raivoso, no tom da polarização simplificadora que domina o debate, defendendo o golpe parlamentar de 2016 e o governo Temer. Em 12 minutos, nada falou sobre o futuro das cidades.
Muito ruim para um político que diz não ser político. Pior ainda para uma cidade que requer um prefeito que administre o presente com os olhos voltados para o futuro, implementando mudanças estruturais no seu modelo urbano, como propõe o Plano Diretor Estratégico.
O prefeito busca forjar uma imagem de gestor moderno. Com marketing eficiente, tem obtido bons resultados, mas sua gestão não resiste a uma avaliação qualificada. Nada tem de moderna; é antiquada nos métodos e tímida nos objetivos.
É autoritária e vertical, desprezando os métodos participativos e colaborativos, contemporâneos. Não trabalha em equipe, impondo aos secretários iniciativas equivocadas e superadas, que contrariam a experiência acumulada de políticas públicas.
Exemplos não faltam. O Conselho de Política Urbana não se reuniu neste ano. Secretários são cobrados por resultados impossíveis de serem alcançados, como mostrou a demissão de Soninha. Outros não são respaldados, caso do secretário de Educação. A relação com o Legislativo é a de sempre.
Afirmando priorizar a educação, fecha salas de leitura, de informática e de brinquedos, quando é consenso entre os educadores que a formação infantil requer atividades lúdicas combinadas com educação formal.
Acelerando, reforça a superada cultura do automóvel, ameaça desativar ruas abertas e ciclovias e aumenta a velocidade, os acidentes e as mortes nas marginais. A solução é recolher as vítimas, com mais rapidez, aos hospitais ou aos cemitérios...
Doria prometeu trazer a eficiência do setor privado para a gestão pública, mas isso está longe de acontecer, como no caso do Programa de Metas. Reduziu as metas a níveis tão insignificantes que será fácil alcançá-las, preservando sua imagem, mesmo sem trazer benefício algum para a população. A proposta é tão tímida e mal formulada que o gestor de uma empresa que propusesse resultados tão inexpressivos seria trocado pelos acionistas.
Se os políticos tradicionais estão desgastados, mais arriscado é investir em fraudes midiáticas. Em tempo, Alckmin, que fechou o seminário, falou com mais pertinência sobre o futuro das cidades.
16/05/2017 02h00
Por Nabil Bonduki
Recentemente, Doria foi convidado a abrir o seminário Cidades do Futuro, promovido por uma rádio paulistana. Esperava-se que ele apontasse os desafios que as grandes cidades devem enfrentar no século 21 (mudanças climáticas, desigualdade, novos modos de vida, violência, mobilidade) e a estratégia proposta para São Paulo.
Para surpresa do público, o prefeito proferiu mais um discurso ideológico e raivoso, no tom da polarização simplificadora que domina o debate, defendendo o golpe parlamentar de 2016 e o governo Temer. Em 12 minutos, nada falou sobre o futuro das cidades.
Muito ruim para um político que diz não ser político. Pior ainda para uma cidade que requer um prefeito que administre o presente com os olhos voltados para o futuro, implementando mudanças estruturais no seu modelo urbano, como propõe o Plano Diretor Estratégico.
O prefeito busca forjar uma imagem de gestor moderno. Com marketing eficiente, tem obtido bons resultados, mas sua gestão não resiste a uma avaliação qualificada. Nada tem de moderna; é antiquada nos métodos e tímida nos objetivos.
É autoritária e vertical, desprezando os métodos participativos e colaborativos, contemporâneos. Não trabalha em equipe, impondo aos secretários iniciativas equivocadas e superadas, que contrariam a experiência acumulada de políticas públicas.
Exemplos não faltam. O Conselho de Política Urbana não se reuniu neste ano. Secretários são cobrados por resultados impossíveis de serem alcançados, como mostrou a demissão de Soninha. Outros não são respaldados, caso do secretário de Educação. A relação com o Legislativo é a de sempre.
Afirmando priorizar a educação, fecha salas de leitura, de informática e de brinquedos, quando é consenso entre os educadores que a formação infantil requer atividades lúdicas combinadas com educação formal.
Acelerando, reforça a superada cultura do automóvel, ameaça desativar ruas abertas e ciclovias e aumenta a velocidade, os acidentes e as mortes nas marginais. A solução é recolher as vítimas, com mais rapidez, aos hospitais ou aos cemitérios...
Doria prometeu trazer a eficiência do setor privado para a gestão pública, mas isso está longe de acontecer, como no caso do Programa de Metas. Reduziu as metas a níveis tão insignificantes que será fácil alcançá-las, preservando sua imagem, mesmo sem trazer benefício algum para a população. A proposta é tão tímida e mal formulada que o gestor de uma empresa que propusesse resultados tão inexpressivos seria trocado pelos acionistas.
Se os políticos tradicionais estão desgastados, mais arriscado é investir em fraudes midiáticas. Em tempo, Alckmin, que fechou o seminário, falou com mais pertinência sobre o futuro das cidades.
Doria diz que 'cracolândia acabou', mas usuários de drogas persistem
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2017/05/1886039-apos-acao-policial-secretario-de-doria-diz-que-nao-vai-mais-ter-cracolandia.shtml
ROGÉRIO PAGNAN
PAULO GOMES
DANILO VERPA
PAULO SALDAÑA
FOLHA DE S.PAULO
21/05/2017 11h33 - Atualizado às 18h24
Após a megaoperação policial do governo Alckmin (PSDB) na manhã deste domingo (21), o prefeito João Doria (PSDB) anunciou o fim do programa Braços Abertos, da gestão de seu antecessor, Fernando Haddad (PT), e disse que a cracolândia "é passado".
"A cracolândia aqui acabou, não vai voltar mais. Nem a prefeitura permitirá, nem o governo do Estado. Essa área será liberada de qualquer circunstância como essa. A partir de hoje, isso é passado", disse o prefeito enquanto caminhava pelo antigo "fluxo", onde funcionava a feira livre das drogas.
Depois da ação policial e da visita de Geraldo Alckmin e João Doria à região, porém, os dependentes químicos seguem espalhados pelas ruas do entorno. Até o fim da tarde, a maior concentração era em um posto de gasolina na esquina da rua Helvétia com a avenida Rio Branco, com cerca de cem usuários, muitos deles deitados no chão.
"Não tem pra onde ir, vou ficar por aqui mesmo até desbaratinar", disse um dos usuários no local.
O comércio e consumo de crack ocorria de maneira irrestrita no local. A menos de cem metros, a Tropa de Choque da polícia militar bloqueava o acesso à rua Helvétia.
Viaturas da PM e da Guarda Civil Metropolitana ainda rodam ou estão estacionadas em várias ruas da região, como na alameda Dino Bueno e Barão de Piracicaba, onde um grupo de 15 usuários fumava crack a pouco metros de policiais.
Em ocasiões distintas, policiais em carros e motos da Tropa de Choque chegaram a passar lentamente observando a movimentação, sem no entanto fazer qualquer abordagem.
Alguns quarteirões dali, na rua Vitória, outro grupo de usuários permanecia reunido na calçada. Próximo ao local, a polícia mantinha isolamento na Conselheiro Nébias com a rua Aurora.
A reportagem presenciou a venda de crack em ao menos outros dois locais da região, na rua Aurora e mais à frente da avenida Rio Branco, em frente à praça Princesa Isabel.
Doria decretou o fim do programa social de Haddad, como já havia anunciado que faria, mas manterá ações do projeto extinto, como auxílio ao dependente químico com emprego, moradia e redução de danos, sob o guarda-chuva de um novo programa, batizado Redenção.
"Não haverá mais pensão ou hotel, nenhuma acomodação desse tipo. Toda a área sofrerá uma amplo projeto de reurbanização", disse Doria.
"Haverá a interdição imediata de todas as pensões e hotéis. Serão bloqueados hoje. Na sequência, derrubados. Serão demolidos. O mais rápido possível. Serão demolidos, essa área será reestruturada urbanisticamente com prioridade para habitação popular", completou o tucano.
Polícia faz operação na Cracolândia em SP
INICIATIVA
Apesar de o prefeito capitalizar a ação na cracolândia, ela foi quase que exclusivamente desenvolvida nesta manhã pelas secretarias de Segurança e Saúde da gestão Geraldo Alckmin (PSDB). Esse protagonismo de Doria gerou descontentamento entre integrantes do governo estadual.
A participação da prefeitura na ação teve início após a saída das polícias civil e militar, de responsabilidade do Estado. A guarda municipal tentará evitar o retorno dos traficantes ao local.
Em sua fala sobre a cracolândia, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) foi mais comedido do que o prefeito em falar sobre o fim da feira livre de drogas no local. Disse que a ação policial hoje é o "primeiro passo".
"O trabalho policial é um trabalho que não termina. O problema da droga não é uma coisa simples. Você tem uma questão crônica que precisa ser enfrentada pela polícia, pela área social e pela saúde." Alckmin enalteceu a parceira com a prefeitura e não deixou de atacar o programa anterior, de Haddad, naquela região.
"Acho que a intenção até foi boa, mas o fato de você ter hotel e pensão, e dar dinheiro, mesada para as pessoas, acabou piorando. Por que você concentrou. E o armamento que a gente apreendeu foi em hotéis e pensões", disse Alckmin.
O secretário estadual de Saúde, David Uip, que também acompanhou a operação deste domingo com equipes de saúde, disse que a situação na região estava crítica.
"Eu tive dificuldades de chegar ao prédio do Recomeço. Eu fui ameaçado, as pessoas só me deixaram entrar quando souberam que eu era da Saúde. Nós, Saúde, e Desenvolvimento Social, estávamos com enorme dificuldade até em abordar e tratar as pessoas naquela região, não era permitido. Até um enfermeiro teve o carro queimado. Não estava dando, estava muito difícil. Agora, com a operação, vamos poder trabalhar naquilo que realmente interessa, que é recuperar os usuários de drogas, que precisam ser tratados e vistos como pacientes."
Como balanço da ação desta manhã, que envolveu cerca de 900 policiais, helicópteros e bombas na região da cracolândia, o prefeito elogiou: "sem vítimas, sem violência, com muita eficiência da força policial". Foram presas 38 pessoas, 28 delas no chamado "fluxo".
Segundo o secretário municipal da Saúde, Wilson Pollara, a região será revitalizada e será feito policiamento ostensivo para evitar que os dependentes químicos voltem a ocupar as ruas da área. "Será feito o acolhimento e eles serão enviados para os centros de tratamento", disse.
Ainda segundo o secretário, os hotéis que servem como base para o tráfico na alameda Dino Bueno serão demolidos.
"Eles [traficantes e dependentes químicos] não vão voltar pra cá", disse o secretário de Assistência e Desenvolvimento Social, Filipe Sabará. Os usuários de crack que estavam na região no momento da ação policial seguem espalhados no entorno.
Apesar de inicialmente a gestão Doria ter afirmado que a demolição dos imóveis na cracolândia começaria já às 14h, posteriormente foi informado que apenas dois muros na alameda Dino Bueno seriam derrubados deste domingo. Os muros, já no chão, serviam como paredes falsas para ocultar esconderijos de drogas, conforme informou a assessoria de imprensa do governo municipal.
Não foi especificado quando terá início a demolição dos hotéis utilizados para o tráfico de drogas na alameda, ainda que Doria tenha dito que ela ocorreria "o mais rápido possível". A Guarda Civil Municipal segue bloqueando o retorno dos dependentes químicos ao trecho da Dino Bueno onde havia o fluxo de usuários.
Morador da região central, Fábio Fortes, membro e ex-presidente do Conseg (Conselho de Segurança) da Santa Cecília, critica a decisão da prefeitura de demolir os prédios no entorno da cracolândia. "Vai criar terrenos baldios perigosos", diz ele, reivindicando manutenção de ação que envolva várias secretarias, como saúde, segurança e assistência social.
Em nota, a gestão Haddad atacou as declarações do governador, acusando a polícia de conivência com o tráfico.
"A gestão Haddad tem dúvidas se o governo do Estado de São Paulo terá condições de conter a corrupção que o assola. Assim como acontece com as estatais estaduais que seguem sem ser investigadas (Dersa, Metrô e CPTM), a gestão anterior entende que a Polícia Civil continuará com suas ações irmanadas ao tráfico na área central da cidade. Por quatro anos consecutivos a gestão anterior pediu uma ação efetiva de combate ao tráfico e não foi atendida. Atribuir ao programa Braços Abertos responsabilidade pelo tráfico é covardia."
TROCA DE PLACA
Entre o fim da operação policial e a chegada do governador e do prefeito, o secretário Filipe Sabará retirou, com um funcionário da prefeitura, a placa que identificava a tenda do Braços Abertos para atendimento a usuários de drogas na cracolândia. A ideia de Doria é dar nova roupagem a ações sociais voltadas a dependentes químicos da região.
A hospedagem e a remuneração por trabalhos como varrição serão preservadas, desde que os usuários se comprometam a fazer tratamentos de desintoxicação ligados ao Recomeço, programa da gestão estadual, de seu correligionário Geraldo Alckmin.
Os programas da prefeitura da cidade e do Estado para dependentes de crack se notabilizaram nos últimos anos por terem princípios conflitantes.
O Recomeço, criado em 2013 por Alckmin, propõe tratamentos por internação, às vezes involuntária, e passagens por comunidades terapêuticas.
Já o de Haddad, do início de 2014, preconizava a redução de danos: o dependente deve diminuir o consumo das drogas enquanto aumenta sua autonomia, por meio da oferta de emprego e moradia, muitas vezes na própria região. O programa de Haddad foi regulamentado por decreto em 28 de abril de 2014. O decreto deve ser revogado em breve, bem como um novo deve ser publicado para o programa Redenção, de Doria.
Apesar de avanços lentos e pontuais, ambas as ações de Alckmin e Haddad vinham sendo alvo de críticas, pela impressão de que mesmo com eles, pouco mudou na ocupação do centro de São Paulo por usuários e traficantes de crack.
Não é a primeira vez que uma gestão afirma que a cracolândia deixou de existir. Em 2008, o prefeito Gilberto Kassab (PSD) comemorou seu fim e, em 2012 a secretária de Justiça de São Paulo fez o mesmo. Na ocasião, Eloisa de Sousa Arruda afirmou que "a cracolândia não existe mais".
sábado, 20 de maio de 2017
Estudos mostram que os homofóbicos são homossexuais enrustidos
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/marilizpereirajorge/2017/05/1883761-estudos-mostram-que-os-homofobicos-sao-homossexuais-enrustidos.shtml
13/05/2017 02h00
Por Mariliz Pereira Jorge
O Departamento de Psicologia da Universidade da Georgia (EUA) conclui o que muita gente desconfia: homofóbicos são gays enrustidos. Na maioria dos casos, há um conflito tão grande quanto à própria sexualidade que o tormento se transforma em raiva e agressividade.
Os pesquisadores recrutaram homens, declaradamente heterossexuais. Eles enfrentaram uma bateria de perguntas que os dividiu em dois grupos: os que se sentiam mais e o que se sentiam menos desconfortáveis com o assunto homossexualidade.
Em seguida todos foram equipados com um pletismógrafo peniano, aparelho que mede o grau de excitação do pênis em resposta a imagens. Os participantes assistiram a cenas de sexo heterossexual, entre duas mulheres e depois entre dois homens.
O surpreendente das reações nessa última situação é que cobaias do grupo com mais tendências homofóbicas tiveram quatro vezes mais aumento de volume peniano do que os do grupo formado por quem não se incomodava com homossexuais. Mais da metade dos "homofóbicos" teve ereção, enquanto menos de um quarto do outro grupo mostrou algum tipo de excitação ao ver as imagens de dois homens transando. Bastante revelador: depois do teste, quando confrontados, todos os homofóbicos negaram o que sentiram minutos antes.
O estudo tem 20 anos. De lá para cá, outras instituições realizaram testes parecidos e o resultado é sempre o mesmo: a atitude negativa, a agressividade, a intolerância e a fobia se manifestam em pessoas que tentam reprimir o desejo sexual que sentem por outros do mesmo gênero.
Essas pesquisas não raramente citam casos de pessoas públicas, homofóbicos engajados, flagrados em relações homossexuais. Podem também ser uma boa explicação para tanto preconceito em ambientes predominantemente masculinos e homofóbicos, como o do futebol.
A sexualidade de um jogador voltou a ser tema de polêmica com a volta de Richarlyson ao futebol brasileiro, depois de uma temporada na Índia e de uma participação no "Dancing Brasil", na TV Record. Toda a história remete à Idade da Pedra.
O Guarani tentou fazer toda a negociação sem que a imprensa e os torcedores soubessem porque dirigentes temiam rejeição. Depois começou a polêmica nas redes sociais. O clima era mais ou menos assim: "O problema de ter o Richarlyson em campo é que sempre o Guarani vai jogar com um homem a menos." "Está certo o Richarlyson, em Campinas só tem veadão, voltou pro seu habitat."
Segunda, dia da apresentação do jogador, o Brinco de Ouro da Princesa, estádio do Guarani, foi alvo de duas bombas atiradas por torcedores. Tanto o clube quanto Richarlyson falam da polêmica em torno de sua contratação sem apontar o real motivo: homofobia.
Richarlyson jamais se declarou gay. Mesmo que seja, parece imprudente sair do armário diante do nível de intolerância que podemos observar. O futebol tem quase 30 mil jogadores profissionais. Alguém acredita que nesse universo não haja homossexuais?
Imagine, então, entre os milhões de torcedores, principalmente entre esses que acham que "bicha" é xingamento, que futebol é coisa de "homem", expulsam e ameaçam membros da torcida descobertos em relações gays, explodem bombas e fazem piadinhas imbecis na internet. Segundo os estudos: tudo gay enrustido.
13/05/2017 02h00
Por Mariliz Pereira Jorge
O Departamento de Psicologia da Universidade da Georgia (EUA) conclui o que muita gente desconfia: homofóbicos são gays enrustidos. Na maioria dos casos, há um conflito tão grande quanto à própria sexualidade que o tormento se transforma em raiva e agressividade.
Os pesquisadores recrutaram homens, declaradamente heterossexuais. Eles enfrentaram uma bateria de perguntas que os dividiu em dois grupos: os que se sentiam mais e o que se sentiam menos desconfortáveis com o assunto homossexualidade.
Em seguida todos foram equipados com um pletismógrafo peniano, aparelho que mede o grau de excitação do pênis em resposta a imagens. Os participantes assistiram a cenas de sexo heterossexual, entre duas mulheres e depois entre dois homens.
O surpreendente das reações nessa última situação é que cobaias do grupo com mais tendências homofóbicas tiveram quatro vezes mais aumento de volume peniano do que os do grupo formado por quem não se incomodava com homossexuais. Mais da metade dos "homofóbicos" teve ereção, enquanto menos de um quarto do outro grupo mostrou algum tipo de excitação ao ver as imagens de dois homens transando. Bastante revelador: depois do teste, quando confrontados, todos os homofóbicos negaram o que sentiram minutos antes.
O estudo tem 20 anos. De lá para cá, outras instituições realizaram testes parecidos e o resultado é sempre o mesmo: a atitude negativa, a agressividade, a intolerância e a fobia se manifestam em pessoas que tentam reprimir o desejo sexual que sentem por outros do mesmo gênero.
Essas pesquisas não raramente citam casos de pessoas públicas, homofóbicos engajados, flagrados em relações homossexuais. Podem também ser uma boa explicação para tanto preconceito em ambientes predominantemente masculinos e homofóbicos, como o do futebol.
A sexualidade de um jogador voltou a ser tema de polêmica com a volta de Richarlyson ao futebol brasileiro, depois de uma temporada na Índia e de uma participação no "Dancing Brasil", na TV Record. Toda a história remete à Idade da Pedra.
O Guarani tentou fazer toda a negociação sem que a imprensa e os torcedores soubessem porque dirigentes temiam rejeição. Depois começou a polêmica nas redes sociais. O clima era mais ou menos assim: "O problema de ter o Richarlyson em campo é que sempre o Guarani vai jogar com um homem a menos." "Está certo o Richarlyson, em Campinas só tem veadão, voltou pro seu habitat."
Segunda, dia da apresentação do jogador, o Brinco de Ouro da Princesa, estádio do Guarani, foi alvo de duas bombas atiradas por torcedores. Tanto o clube quanto Richarlyson falam da polêmica em torno de sua contratação sem apontar o real motivo: homofobia.
Richarlyson jamais se declarou gay. Mesmo que seja, parece imprudente sair do armário diante do nível de intolerância que podemos observar. O futebol tem quase 30 mil jogadores profissionais. Alguém acredita que nesse universo não haja homossexuais?
Imagine, então, entre os milhões de torcedores, principalmente entre esses que acham que "bicha" é xingamento, que futebol é coisa de "homem", expulsam e ameaçam membros da torcida descobertos em relações gays, explodem bombas e fazem piadinhas imbecis na internet. Segundo os estudos: tudo gay enrustido.
Por que o mundo enfrenta sua pior crise humanitária desde 1945?
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2017/03/1866958-por-que-o-mundo-enfrenta-sua-pior-crise-humanitaria-desde-1945.shtml
DAVID PILLING
DO "FINANCIAL TIMES"
16/03/2017 07h00
A ONU alertou que o planeta está enfrentando sua pior crise humanitária desde que a organização foi fundada, em 1945. Segundo as Nações Unidas, 20 milhões de pessoas enfrentam "níveis devastadores de insegurança alimentar", no Iêmen, Sudão do Sul, Somália e nordeste da Nigéria.
"Sem esforços mundiais coletivos e coordenados, pessoas simplesmente morrerão de fome", disse Stephen O'Brien, o chefe de operações humanitárias das Nações Unidas, ao Conselho de Segurança da organização, na sexta-feira. "Muito mais pessoas sofrerão e morrerão por causa de doenças".
As agências assistenciais vêm alertando há meses, e no caso da Somália, há anos, de que uma catástrofe está iminente. Mas a situação se deteriorou rapidamente nos últimos 12 meses.
No mês passado, a ONU e o governo do Sudão do Sul declararam estado de fome em algumas regiões do país. A ONU diz necessitar de US$ 5,4 bilhões para enfrentar a crise, mas dispõe de apenas uma fração ínfima dessa quantia para emprego imediato.
Eis uma lista das causas de escassez de alimentos, e das medidas que estão sendo tomadas para combatê-la:
*
Essas crises são causadas por ações humanas?
A resposta resumida é sim, ainda que em graus variáveis. A Somália é a exceção.
Desde que o Sudão do Sul, o mais novo país do planeta, se tornou independente, em 2011, as disputas internas são constantes. O governo do presidente Salva Kiir e seu principal rival, e antigo vice, Riek Machar não conseguiram resolver as diferenças étnicas profundamente enraizadas e nem sua disputa pelo poder, e o país decaiu à guerra civil.
As agências assistenciais afirmam que, em algumas das regiões mais prejudicadas, numerosas facções armadas estão disputando o território. Os civis fugiram de suas terras, exacerbando uma crise de alimentação já aguda. Cerca de 100 mil dessas pessoas estão passando fome e a ONU alertou que outros 5,5 milhões de pessoas, ou 40% da população do país, estão em risco.
O nordeste da Nigéria é o foco da militância da organização extremista Boko Haram. Nos últimos 12 meses, o governo fez avanços em sua campanha militar contra ela, mas centenas de milhares de pessoas se viram forçadas a deixar suas casas ou estão imobilizadas em áreas sob o controle do Boko Haram.
O Programa Mundial de Alimentos da ONU afirma que há famílias individuais passando fome, mas que essa situação ainda não se generalizou o bastante para que uma situação de fome seja declarada oficialmente na área.
O conflito no Iêmen, que já dura dois anos, levou o mais pobre dos Estados árabes a uma crise humanitária e deixou milhões de pessoas à beira da fome. A guerra vem sendo agravada pela disputa entre Arábia Saudita e Irã, duas potências regionais rivais.
Os sauditas criaram uma coalizão militar sob liderança sunita, dois anos atrás, para combater os rebeldes houthis apoiados pelo Irã, que derrubaram o governo. Mais de 10 mil civis morreram. Cerca de sete milhões de pessoas enfrentam severa escassez de alimentos. Os sauditas estão bloqueando os portos iemenitas, ostensivamente para impedir o ingresso de armas, mas isso também afeta a importação de comida.
E a Somália?
A Somália é diferente porque a principal razão para a fome no país é uma seca, descrita por estudiosos de questões agrícolas como a pior da última geração. As temperaturas vêm subindo no Chifre da África, e os padrões climáticos se tornaram menos previsíveis, fenômeno que alguns atribuem ao aquecimento global.
A falta de um governo efetivo e a insurgência do movimento Al Shabaab, um grupo radical islâmico vinculado à rede terrorista Al Qaeda, não ajudaram mas não são a causa principal da fome cada vez mais grave.
Kevin Watkins, presidente da organização assistencial Save the Children, recentemente visitou Puntlândia, no nordeste da Somália, e descreveu a situação da região como "à beira do precipício".
Carcaças de animais mortos se espalhavam pela área. Em 2011, a estimativa é que 260 mil pessoas tenham morrido de fome no país, de acordo com um relatório da ONU e da Fews Net, uma organização de alerta antecipado quanto a ondas de fome.
O relatório critica a comunidade internacional por ter demorado demais a agir. Watkins disse que isso não se repetirá em 2017. Mas poderia acontecer.
Qual é a definição para uma onda de fome?
As agências da ONU e as organizações assistenciais aderem a uma definição estrita de fome, classificando-a em uma escala internacionalmente reconhecida que vai de um, ou seja, uma situação alimentícia normal, a cinco, que significa fome generalizada.
Um alerta de fome é declarado quando pelo menos 20% dos domicílios de uma região enfrentam completa falta de alimentos, o nível de subnutrição aguda supera os 30% da população, e mais de duas em cada 10 mil pessoas morrem por dia.
Os doadores estão esgotados?
A crise de refugiados deflagrada pela guerra na Síria atraiu boa parte da atenção e das verbas de assistência internacional. Nos países ocidentais, o apetite por assistência internacional se reduziu, em diversas camadas da população.
Mas Challiss McDonough, porta-voz regional do Programa Mundial de Alimentação da ONU, diz que "esgotamento não é a palavra certa".
Falando sobre Juba, a capital do Sudão do Sul, ela acrescentou que "é mais como se o sistema de assistência humanitária estivesse sobrecarregado ao ponto da paralisia. Há 20 milhões de pessoas expostas à fome. Um ano atrás, eu teria classificado uma situação assim como inimaginável".
Os países estão condenados a repetir essas catástrofes ano após ano?
Não. A Etiópia é um país muitas vezes associado à fome em larga escala por causa da onda de fome de 1983-1985, na qual pelo menos 400 mil pessoas morreram (e algumas estimativas elevam esse total a um milhão de mortos).
De lá para cá, porém, um novo governo —autoritário e repressivo, mas com uma forte agenda de desenvolvimento— tomou medidas sérias para impedir que uma fome em grande escala voltasse a acontecer.
No ano passado, a Etiópia sofreu sua pior seca em pelo menos três décadas. Algumas pessoas certamente passaram fome, mas o país montou uma resposta coordenada, que foi facilitada pela grande melhora na infraestrutura, por anos de crescimento econômico rápido, e por planejamento prudente.
Um estudo da Fundação Mundial pela Paz demonstra que entre 1870 e 1980, 115 milhões de pessoas morreram de fome —90% das quais como resultado de guerras, conquistas e repressão.
Os números caíram, depois disso. Mas se Estados entrarem em colapso e governos ou extremistas colocarem seus objetivos acima da segurança alimentar do povo, a fome em massa ainda pode atacar.
Tradução de PAULO MIGLIACCI.
DAVID PILLING
DO "FINANCIAL TIMES"
16/03/2017 07h00
A ONU alertou que o planeta está enfrentando sua pior crise humanitária desde que a organização foi fundada, em 1945. Segundo as Nações Unidas, 20 milhões de pessoas enfrentam "níveis devastadores de insegurança alimentar", no Iêmen, Sudão do Sul, Somália e nordeste da Nigéria.
"Sem esforços mundiais coletivos e coordenados, pessoas simplesmente morrerão de fome", disse Stephen O'Brien, o chefe de operações humanitárias das Nações Unidas, ao Conselho de Segurança da organização, na sexta-feira. "Muito mais pessoas sofrerão e morrerão por causa de doenças".
As agências assistenciais vêm alertando há meses, e no caso da Somália, há anos, de que uma catástrofe está iminente. Mas a situação se deteriorou rapidamente nos últimos 12 meses.
No mês passado, a ONU e o governo do Sudão do Sul declararam estado de fome em algumas regiões do país. A ONU diz necessitar de US$ 5,4 bilhões para enfrentar a crise, mas dispõe de apenas uma fração ínfima dessa quantia para emprego imediato.
Eis uma lista das causas de escassez de alimentos, e das medidas que estão sendo tomadas para combatê-la:
*
Essas crises são causadas por ações humanas?
A resposta resumida é sim, ainda que em graus variáveis. A Somália é a exceção.
Desde que o Sudão do Sul, o mais novo país do planeta, se tornou independente, em 2011, as disputas internas são constantes. O governo do presidente Salva Kiir e seu principal rival, e antigo vice, Riek Machar não conseguiram resolver as diferenças étnicas profundamente enraizadas e nem sua disputa pelo poder, e o país decaiu à guerra civil.
As agências assistenciais afirmam que, em algumas das regiões mais prejudicadas, numerosas facções armadas estão disputando o território. Os civis fugiram de suas terras, exacerbando uma crise de alimentação já aguda. Cerca de 100 mil dessas pessoas estão passando fome e a ONU alertou que outros 5,5 milhões de pessoas, ou 40% da população do país, estão em risco.
O nordeste da Nigéria é o foco da militância da organização extremista Boko Haram. Nos últimos 12 meses, o governo fez avanços em sua campanha militar contra ela, mas centenas de milhares de pessoas se viram forçadas a deixar suas casas ou estão imobilizadas em áreas sob o controle do Boko Haram.
O Programa Mundial de Alimentos da ONU afirma que há famílias individuais passando fome, mas que essa situação ainda não se generalizou o bastante para que uma situação de fome seja declarada oficialmente na área.
O conflito no Iêmen, que já dura dois anos, levou o mais pobre dos Estados árabes a uma crise humanitária e deixou milhões de pessoas à beira da fome. A guerra vem sendo agravada pela disputa entre Arábia Saudita e Irã, duas potências regionais rivais.
Os sauditas criaram uma coalizão militar sob liderança sunita, dois anos atrás, para combater os rebeldes houthis apoiados pelo Irã, que derrubaram o governo. Mais de 10 mil civis morreram. Cerca de sete milhões de pessoas enfrentam severa escassez de alimentos. Os sauditas estão bloqueando os portos iemenitas, ostensivamente para impedir o ingresso de armas, mas isso também afeta a importação de comida.
E a Somália?
A Somália é diferente porque a principal razão para a fome no país é uma seca, descrita por estudiosos de questões agrícolas como a pior da última geração. As temperaturas vêm subindo no Chifre da África, e os padrões climáticos se tornaram menos previsíveis, fenômeno que alguns atribuem ao aquecimento global.
A falta de um governo efetivo e a insurgência do movimento Al Shabaab, um grupo radical islâmico vinculado à rede terrorista Al Qaeda, não ajudaram mas não são a causa principal da fome cada vez mais grave.
Kevin Watkins, presidente da organização assistencial Save the Children, recentemente visitou Puntlândia, no nordeste da Somália, e descreveu a situação da região como "à beira do precipício".
Carcaças de animais mortos se espalhavam pela área. Em 2011, a estimativa é que 260 mil pessoas tenham morrido de fome no país, de acordo com um relatório da ONU e da Fews Net, uma organização de alerta antecipado quanto a ondas de fome.
O relatório critica a comunidade internacional por ter demorado demais a agir. Watkins disse que isso não se repetirá em 2017. Mas poderia acontecer.
Qual é a definição para uma onda de fome?
As agências da ONU e as organizações assistenciais aderem a uma definição estrita de fome, classificando-a em uma escala internacionalmente reconhecida que vai de um, ou seja, uma situação alimentícia normal, a cinco, que significa fome generalizada.
Um alerta de fome é declarado quando pelo menos 20% dos domicílios de uma região enfrentam completa falta de alimentos, o nível de subnutrição aguda supera os 30% da população, e mais de duas em cada 10 mil pessoas morrem por dia.
Os doadores estão esgotados?
A crise de refugiados deflagrada pela guerra na Síria atraiu boa parte da atenção e das verbas de assistência internacional. Nos países ocidentais, o apetite por assistência internacional se reduziu, em diversas camadas da população.
Mas Challiss McDonough, porta-voz regional do Programa Mundial de Alimentação da ONU, diz que "esgotamento não é a palavra certa".
Falando sobre Juba, a capital do Sudão do Sul, ela acrescentou que "é mais como se o sistema de assistência humanitária estivesse sobrecarregado ao ponto da paralisia. Há 20 milhões de pessoas expostas à fome. Um ano atrás, eu teria classificado uma situação assim como inimaginável".
Os países estão condenados a repetir essas catástrofes ano após ano?
Não. A Etiópia é um país muitas vezes associado à fome em larga escala por causa da onda de fome de 1983-1985, na qual pelo menos 400 mil pessoas morreram (e algumas estimativas elevam esse total a um milhão de mortos).
De lá para cá, porém, um novo governo —autoritário e repressivo, mas com uma forte agenda de desenvolvimento— tomou medidas sérias para impedir que uma fome em grande escala voltasse a acontecer.
No ano passado, a Etiópia sofreu sua pior seca em pelo menos três décadas. Algumas pessoas certamente passaram fome, mas o país montou uma resposta coordenada, que foi facilitada pela grande melhora na infraestrutura, por anos de crescimento econômico rápido, e por planejamento prudente.
Um estudo da Fundação Mundial pela Paz demonstra que entre 1870 e 1980, 115 milhões de pessoas morreram de fome —90% das quais como resultado de guerras, conquistas e repressão.
Os números caíram, depois disso. Mas se Estados entrarem em colapso e governos ou extremistas colocarem seus objetivos acima da segurança alimentar do povo, a fome em massa ainda pode atacar.
Tradução de PAULO MIGLIACCI.
Bolsonaro admitiu atos de indisciplina e deslealdade no Exército
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/05/1884033-bolsonaro-admitiu-atos-de-indisciplina-e-deslealdade-no-exercito.shtml
RUBENS VALENTE
DE BRASÍLIA
15/05/2017 02h00 - Atualizado às 13h14
Documentos obtidos pela Folha no STM (Superior Tribunal Militar) mostram que o deputado e presidenciável Jair Bolsonaro (PSC-RJ) admitiu em 1987 ter cometido atos de indisciplina e deslealdade para com os seus superiores no Exército.
O então capitão foi acusado por cinco irregularidades e teve que a responder a um Conselho de Justificação, uma espécie de inquérito, formado por três coronéis.
Ele foi considerado culpado pelos coronéis, mas absolvido depois em recurso acolhido pelos ministros do STM, por 8 votos a 4.
O processo tinha dois objetos: um artigo que ele escreveu em 1986 para a revista "Veja" para pedir aumento salarial para a tropa, sem consulta aos seus superiores, e a afirmação, meses depois, pela mesma publicação, de que ele e outro oficial haviam elaborado um plano para explodir bombas-relógio em unidades militares do Rio.
Os documentos informam que, pela autoria do artigo, Bolsonaro foi preso por 15 dias ao "ter ferido a ética, gerando clima de inquietação na organização militar" e "por ter sido indiscreto na abordagem de assuntos de caráter oficial, comprometendo a disciplina".
O Exército detectou um movimento para desestabilizar a cadeia de comando e determinou uma investigação, a mando do ministro e general Leonidas Pires Gonçalves (1921-2015), alvo de Bolsonaro.
Em interrogatório reservado de 1987, o então capitão assinou documento no qual reconhece ter cometido uma "transgressão disciplinar" ao escrever para "Veja". "E que, à época, não levou em consideração que seria uma deslealdade mas que, agora, acha que sim", disse ao depor.
O STM decidiu que pelo artigo ele já havia sido punido com a prisão. Depois, a revista publicou que ele e outro capitão haviam elaborado um plano chamado "Beco sem saída", que previa uma série de explosões. Como evidência, a revista divulgou esboços atribuídos a Bolsonaro.
Na reportagem, ele dizia que haveria "só a explosão de algumas espoletas" e explicava como fazer uma bomba-relógio. "Nosso Exército é uma vergonha nacional, e o ministro está se saindo como um segundo Pinochet", afirmava.
Havia outros movimentos militares pelo país, como um capitão que invadiu uma prefeitura para pedir reajuste. Acuado, o então presidente José Sarney deu um aumento escalonado de 95% nos salários das Forças Armadas.
Bolsonaro negou a autoria de qualquer plano de bombas e citou que dois exames grafotécnicos resultaram inconclusos. Perícia da Polícia Federal, porém, foi inequívoca ao concluir que as anotações eram dele.
Os coronéis decidiram, por unanimidade, pela condenação. "O Justificante [Bolsonaro] mentiu durante todo o processo, quando negou a autoria dos esboços publicados na revista 'Veja', como comprovam os laudos periciais."
Segundo documento assinado por três coronéis, Bolsonaro "revelou comportamento aético e incompatível com o pundonor militar e o decoro da classe, ao passar à imprensa informações sobre sua instituição".
Pela lei, decisões do conselho deviam ser enviadas ao STM. No tribunal, Bolsonaro negou em abril de 1988 o plano das bombas, mas reconheceu a autoria do artigo: "Admito também a transgressão disciplinar [...], pela qual, acertada e justamente, fui punido com quinze dias de prisão, única punição por mim sofrida até a presente data".
OUTRO LADO
A assessoria do deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) afirmou na sexta (12) que a reportagem da Folha "é idiota e imbecil" e indagou "quem estava pagando" pelo trabalho.
A Folha pediu uma manifestação do parlamentar, mas não houve resposta até a conclusão desta edição. O assessor do parlamentar se recusou a anotar os telefones de contato do repórter.
Segundo a assessoria, a "pauta é uma merda".
Em resposta ao Superior Tribunal Militar em 1988, ele afirmou que escreveu o artigo para "Veja" para pedir reajuste salarial "em defesa de minha família e de minha classe, mesmo sabendo que estava ferindo o Regulamento Disciplinar do Exército".
"Onde encontrar indignidade no artigo publicado na revista?", indagou Bolsonaro em sua defesa.
Sobre a ideia de fazer explosões, Bolsonaro voltou a negá-la: "Nego veementemente tal plano. Como posso provar que não o conhecia? À 'Veja' cabe o ônus da prova. Baseado em que elementos chegou à absurda conclusão de que eu tinha ou sabia de um plano?"
A respeito dos exames grafotécnicos feitos pela Polícia Federal e pela Polícia do Exército que o incriminaram, ele afirmou que havia dois outros, inconclusos.
Segundo o então capitão, houve "gritante cerceamento do direito de defesa" no processo pelo qual o Conselho de Justificação o condenou, em janeiro de 1988.
CRONOLOGIA
3.set.1986
A revista "Veja" publica artigo do então capitão Jair Bolsonaro, "O salário está baixo", em que pede aumento: "Não consigo sonhar com as necessidades mínimas que uma pessoa do meu nível cultural e social poderia almejar"
Bolsonaro é preso por "transgressão grave". É acusado de "ter ferido a ética, gerando clima de inquietação no âmbito da organização militar" e também "por ter sido indiscreto na abordagem de assuntos de caráter oficial"
25.out.1987
A revista "Veja" divulga a reportagem "Pôr bombas nos quartéis, um plano na Esao", na qual afirma que Bolsonaro, lotado na Escola Superior de Aperfeiçoamento de Oficiais, e outro militar, Fábio Passos, elaboraram um plano que previa a explosão de bombas em unidades militares do Rio para pressionar seus superiores
Segundo a reportagem, Bolsonaro teria dito que haveria "só a explosão de algumas espoletas" e explicou como construir uma bomba-relógio à base de TNT
25.out.1987
Bolsonaro e Passos entregam ao comando da Esao textos de próprio punho nos quais negam ter feito o plano e falado com a "Veja"
1º.nov.1987
"Veja" publica uma segunda reportagem, "De próprio punho", na qual traz o fac-símile de um croqui que teria sido desenhado por Bolsonaro com pontos em que as bombas seriam distribuídas. Ele nega a autoria repetidas vezes
13.nov.1987
Sindicância da Esao conclui que há aspectos a serem melhor investigados e sugere remessa dos autos a um Conselho de Justificação
15.dez.1987
Acusação diz que Bolsonaro agiu "comprometendo a disciplina e ferindo a ética militar"
8.jan.1988
Laudo de exame grafotécnico da Polícia Federal afirma que partiram do punho de Bolsonaro as anotações no croqui entregue pela "Veja"
25.jan.1988
Em sessão secreta, o Conselho de Justificação decide por unanimidade considerar Bolsonaro culpado
"O Justificante [Bolsonaro] mentiu durante todo o processo, quando negou a autoria dos esboços publicados na revista 'Veja', como comprovam os laudos periciais do Instituto de Criminalística da Polícia Federal e do 1º Batalhão de Polícia do Exército"
16.jun.1988
Por 8 votos a 4, os ministros do Superior Tribunal Militar consideraram Bolsonaro "não culpado" das acusações, diz que duas perícias confirmaram a autoria e duas não a confirmaram, o que configura "na dúvida a favor do réu"
Sobre o texto na "Veja", o STM decidiu que "o justificante assumiu total responsabilidade por seu ato, foi punido com 15 dias de prisão"
22.dez.1988
Segundo extrato da ficha cadastro de Bolsonaro, fornecido pelo Exército à Folha, o militar "foi excluído do serviço ativo do Exército, a contar de 22 de dezembro de 1988, passando a integrar a Reserva Remunerada".
RUBENS VALENTE
DE BRASÍLIA
15/05/2017 02h00 - Atualizado às 13h14
Documentos obtidos pela Folha no STM (Superior Tribunal Militar) mostram que o deputado e presidenciável Jair Bolsonaro (PSC-RJ) admitiu em 1987 ter cometido atos de indisciplina e deslealdade para com os seus superiores no Exército.
O então capitão foi acusado por cinco irregularidades e teve que a responder a um Conselho de Justificação, uma espécie de inquérito, formado por três coronéis.
Ele foi considerado culpado pelos coronéis, mas absolvido depois em recurso acolhido pelos ministros do STM, por 8 votos a 4.
O processo tinha dois objetos: um artigo que ele escreveu em 1986 para a revista "Veja" para pedir aumento salarial para a tropa, sem consulta aos seus superiores, e a afirmação, meses depois, pela mesma publicação, de que ele e outro oficial haviam elaborado um plano para explodir bombas-relógio em unidades militares do Rio.
Os documentos informam que, pela autoria do artigo, Bolsonaro foi preso por 15 dias ao "ter ferido a ética, gerando clima de inquietação na organização militar" e "por ter sido indiscreto na abordagem de assuntos de caráter oficial, comprometendo a disciplina".
O Exército detectou um movimento para desestabilizar a cadeia de comando e determinou uma investigação, a mando do ministro e general Leonidas Pires Gonçalves (1921-2015), alvo de Bolsonaro.
Em interrogatório reservado de 1987, o então capitão assinou documento no qual reconhece ter cometido uma "transgressão disciplinar" ao escrever para "Veja". "E que, à época, não levou em consideração que seria uma deslealdade mas que, agora, acha que sim", disse ao depor.
O STM decidiu que pelo artigo ele já havia sido punido com a prisão. Depois, a revista publicou que ele e outro capitão haviam elaborado um plano chamado "Beco sem saída", que previa uma série de explosões. Como evidência, a revista divulgou esboços atribuídos a Bolsonaro.
Na reportagem, ele dizia que haveria "só a explosão de algumas espoletas" e explicava como fazer uma bomba-relógio. "Nosso Exército é uma vergonha nacional, e o ministro está se saindo como um segundo Pinochet", afirmava.
Havia outros movimentos militares pelo país, como um capitão que invadiu uma prefeitura para pedir reajuste. Acuado, o então presidente José Sarney deu um aumento escalonado de 95% nos salários das Forças Armadas.
Bolsonaro negou a autoria de qualquer plano de bombas e citou que dois exames grafotécnicos resultaram inconclusos. Perícia da Polícia Federal, porém, foi inequívoca ao concluir que as anotações eram dele.
Os coronéis decidiram, por unanimidade, pela condenação. "O Justificante [Bolsonaro] mentiu durante todo o processo, quando negou a autoria dos esboços publicados na revista 'Veja', como comprovam os laudos periciais."
Segundo documento assinado por três coronéis, Bolsonaro "revelou comportamento aético e incompatível com o pundonor militar e o decoro da classe, ao passar à imprensa informações sobre sua instituição".
Pela lei, decisões do conselho deviam ser enviadas ao STM. No tribunal, Bolsonaro negou em abril de 1988 o plano das bombas, mas reconheceu a autoria do artigo: "Admito também a transgressão disciplinar [...], pela qual, acertada e justamente, fui punido com quinze dias de prisão, única punição por mim sofrida até a presente data".
OUTRO LADO
A assessoria do deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) afirmou na sexta (12) que a reportagem da Folha "é idiota e imbecil" e indagou "quem estava pagando" pelo trabalho.
A Folha pediu uma manifestação do parlamentar, mas não houve resposta até a conclusão desta edição. O assessor do parlamentar se recusou a anotar os telefones de contato do repórter.
Segundo a assessoria, a "pauta é uma merda".
Em resposta ao Superior Tribunal Militar em 1988, ele afirmou que escreveu o artigo para "Veja" para pedir reajuste salarial "em defesa de minha família e de minha classe, mesmo sabendo que estava ferindo o Regulamento Disciplinar do Exército".
"Onde encontrar indignidade no artigo publicado na revista?", indagou Bolsonaro em sua defesa.
Sobre a ideia de fazer explosões, Bolsonaro voltou a negá-la: "Nego veementemente tal plano. Como posso provar que não o conhecia? À 'Veja' cabe o ônus da prova. Baseado em que elementos chegou à absurda conclusão de que eu tinha ou sabia de um plano?"
A respeito dos exames grafotécnicos feitos pela Polícia Federal e pela Polícia do Exército que o incriminaram, ele afirmou que havia dois outros, inconclusos.
Segundo o então capitão, houve "gritante cerceamento do direito de defesa" no processo pelo qual o Conselho de Justificação o condenou, em janeiro de 1988.
CRONOLOGIA
3.set.1986
A revista "Veja" publica artigo do então capitão Jair Bolsonaro, "O salário está baixo", em que pede aumento: "Não consigo sonhar com as necessidades mínimas que uma pessoa do meu nível cultural e social poderia almejar"
Bolsonaro é preso por "transgressão grave". É acusado de "ter ferido a ética, gerando clima de inquietação no âmbito da organização militar" e também "por ter sido indiscreto na abordagem de assuntos de caráter oficial"
25.out.1987
A revista "Veja" divulga a reportagem "Pôr bombas nos quartéis, um plano na Esao", na qual afirma que Bolsonaro, lotado na Escola Superior de Aperfeiçoamento de Oficiais, e outro militar, Fábio Passos, elaboraram um plano que previa a explosão de bombas em unidades militares do Rio para pressionar seus superiores
Segundo a reportagem, Bolsonaro teria dito que haveria "só a explosão de algumas espoletas" e explicou como construir uma bomba-relógio à base de TNT
25.out.1987
Bolsonaro e Passos entregam ao comando da Esao textos de próprio punho nos quais negam ter feito o plano e falado com a "Veja"
1º.nov.1987
"Veja" publica uma segunda reportagem, "De próprio punho", na qual traz o fac-símile de um croqui que teria sido desenhado por Bolsonaro com pontos em que as bombas seriam distribuídas. Ele nega a autoria repetidas vezes
13.nov.1987
Sindicância da Esao conclui que há aspectos a serem melhor investigados e sugere remessa dos autos a um Conselho de Justificação
15.dez.1987
Acusação diz que Bolsonaro agiu "comprometendo a disciplina e ferindo a ética militar"
8.jan.1988
Laudo de exame grafotécnico da Polícia Federal afirma que partiram do punho de Bolsonaro as anotações no croqui entregue pela "Veja"
25.jan.1988
Em sessão secreta, o Conselho de Justificação decide por unanimidade considerar Bolsonaro culpado
"O Justificante [Bolsonaro] mentiu durante todo o processo, quando negou a autoria dos esboços publicados na revista 'Veja', como comprovam os laudos periciais do Instituto de Criminalística da Polícia Federal e do 1º Batalhão de Polícia do Exército"
16.jun.1988
Por 8 votos a 4, os ministros do Superior Tribunal Militar consideraram Bolsonaro "não culpado" das acusações, diz que duas perícias confirmaram a autoria e duas não a confirmaram, o que configura "na dúvida a favor do réu"
Sobre o texto na "Veja", o STM decidiu que "o justificante assumiu total responsabilidade por seu ato, foi punido com 15 dias de prisão"
22.dez.1988
Segundo extrato da ficha cadastro de Bolsonaro, fornecido pelo Exército à Folha, o militar "foi excluído do serviço ativo do Exército, a contar de 22 de dezembro de 1988, passando a integrar a Reserva Remunerada".
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