sábado, 22 de abril de 2017

Na disputa com a Coreia do Norte, Trump acerta também os chineses

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2017/04/1876573-na-disputa-com-a-coreia-do-norte-trump-acerta-tambem-os-chineses.shtml

IGOR GIELOW
DE SÃO PAULO

18/04/2017  16h42

Grande novidade da fase "macho man" do presidente Donald Trump, a escalada nas ameaças contra o regime ditatorial da Coreia do Norte tem cumprido um objetivo mais estratégico do que tático: enquadrar os irmãos maiores de Pyongyang, a ditadura de Pequim. O problema é que a situação pode sair do controle, tantos são os elementos voláteis envolvidos.

Depois de passar sua campanha eleitoral fustigando as táticas comerciais chinesas, Trump foi além e conversou com a presidente de Taiwan em termos iguais antes mesmo de assumir o cargo, deixando os comissários chineses enfurecidos. Em um de seus vários recuos, o republicano voltou atrás e se disse fiel ao princípio que rege a relação com a China desde os anos 1970: a indivisibilidade da nação asiática, incluindo aí a ilha considerada rebelde pelo governo de Xi Jinping.

Agora, Trump volta suas baterias retóricas e militares contra Pyongyang, logo depois de soltar a "mãe de todas as bombas" Afeganistão e atacar a Síria aliada de Vladimir Putin. Ao mesmo tempo, cobra que os chineses usem sua influência para conter o ditador Kim Jong-un. O faz pelos métodos conhecidos, de tuítes ao envio de um grupo de ataque de porta-aviões, e inicialmente parece obter sucesso.

De fato, os chineses endureceram sua retórica. Se irão mesmo cortar o fornecimento de petróleo e outros produtos que fazem girar a economia norte-coreana, é algo ainda a ver. Mas para quem comemorou em jornais oficiais que Trump era o proverbial "tigre de papel", é uma mudança sensível aceitar tal pressão.

O cenário, contudo, é muito perigoso. Kim poderá resolver testar o grau de bravata das declarações de altos funcionários americanos e do próprio presidente, e acabar por fazer um teste de mísseis ou explodir um artefato nuclear. Como Trump praticamente desenhou isso como limite para agir militarmente contra os norte-coreanos, o impasse prossegue.

No desfile patriótico de sábado (15), se a celebração personalista de uma dinastia permite tal qualificação, os norte-coreanos sinalizaram para os especialistas em armas do lado adversário que avançaram em sua promessa de desenvolver um programa de mísseis capaz de ameaçar EUA, Coreia do Sul e Japão com eficácia.

Céticos dirão que os grandes transportadores do que seriam mísseis intercontinentais poderiam estar simplesmente vazios, o que é uma possibilidade. Até aqui, contudo, toda a evolução dos testes norte-coreanos aponta que eles cumprem suas intenções propagandísticas. Houve também o aparente fracasso de um lançamento, algo normal. Hoje há poucos analistas sérios que não consideram que as redondezas do país correm risco de serem bombardeadas, talvez até com uma arma nuclear –embora aqui a discussão técnica seja mais complexa, e faltam dados confiáveis.

O desenvolvimento de uma capacidade intercontinental ainda não foi testado plenamente, mas aí o limite ultrapassado talvez até supere o das bravatas: qual presidente americano, ainda mais um tipo mercurial como Trump, permitiria que os EUA ficassem reféns de um regime aberrante com capacidade de destruir alguma de suas cidades?

Por isso, é bom para a paz mundial que a pressão sobre a China funcione duplamente, sobre ela e sobre seus aliados norte-coreanos. A alternativa só comporta cenários impensáveis, por mais possíveis que sejam hoje.

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